O QUE HÁ DE ESPECIAL NOS JUIZADOS ESPECIAIS: POR UMA LEITURA CRÍTICA DO TRATAMENTO PROCESSUAL CONFERIDO ÀS "PEQUENAS" CAUSAS

Autores

DOI:

https://doi.org/10.20873/uft.2359-0106.2023.v10n1.p31-55

Palavras-chave:

Acesso à justiça, Juizados Especiais, Lei 9.099/95, seletividade

Resumo

Os Juizados Especiais foram instaurados com o propósito de disponibilizar procedimentos céleres, simples e informais, com contornos mais adequados às necessidades dos cidadãos em situação de hipossuficiência econômica, social e informacional. Inobstante, várias das regras aplicadas ao sistema dos juizados não se coadunam com o intuito de ampliação do acesso à justiça, eis que, ao invés articularem um mecanismo eficiente para a tutela de litigantes vulneráveis, dificultam a reivindicação de seus direitos em juízo. Desse modo, com base em revisão bibliográfica e em inferências de caráter predominantemente indutivo, o presente estudo tem por objetivo avaliar a dissonância do discurso que legitimou a instauração dos Juizados Especiais em relação às diretrizes procedimentais consignadas nas leis responsáveis por regulamentá-los. Num primeiro momento, serão revisitados marcos teóricos que exploraram o entrelaçamento do campo do processo civil com a ideologia e a cultura, a fim de demonstrar que o conteúdo do direito processual é fortemente influenciado por forças exteriores ao universo jurídico. Após, proceder-se-á à análise do conteúdo da Lei no 9.099/95, de modo a apontar dispositivos que contradizem a promessa dos Juizados Especiais de tutelar os direitos dos cidadãos hipossuficientes. Na sequência, com base no conceito de seletividade do sociólogo Claus Offe, serão esboçadas possíveis explicações para as contradições havidas entre a aparência e a realidade dos Juizados Especiais, sugerindo-se que, por detrás de sua configuração procedimental, reside o intuito de precarizar o tratamento das “pequenas” causas. Por fim, serão expostas as conclusões alcançadas ao longo da pesquisa.

 

Biografia do Autor

Alberto Luiz Hanemann Bastos, Universidade Federal do Paraná

Mestrando em Direitos Humanos e Democracia pela Universidade Federal do Paraná – UFPR. Pós-graduação em Processo Civil pelo Instituto de Direito Romeu Felipe Bacellar. Professor de Direito Administrativo e de Direito Previdenciário do Centro Universitário Santa Cruz de Curitiba – UniSantaCruz. Membro da Rede de Estudos Interdisciplinares de Seguridade e Trabalho (RESIST) e do Grupo de Estudos em Trabalho, Economia e Políticas Públicas (TRAEPP). Advogado

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Publicado

2023-07-04

Como Citar

Bastos, A. L. H. (2023). O QUE HÁ DE ESPECIAL NOS JUIZADOS ESPECIAIS: POR UMA LEITURA CRÍTICA DO TRATAMENTO PROCESSUAL CONFERIDO ÀS "PEQUENAS" CAUSAS. Revista Vertentes Do Direito, 10(1), 31–55. https://doi.org/10.20873/uft.2359-0106.2023.v10n1.p31-55

Edição

Seção

Artigo Científico