A NECESSIDADE DE ESGOTAMENTO DAS INSTÂNCIAS DESPORTIVAS SOB A ÓTICA DO PRINCÍPIO DO LIVRE ACESSO À JURISDIÇÃO
DOI:
https://doi.org/10.20873/uft.2359-0106.2022.v9n2.p280-306Palavras-chave:
justiça desportiva, método ideal de solução de conflitos, normas constitucionais originárias, princípio do livre acesso à jurisdiçãoResumo
A Constituição de 1988 consagrou o princípio do livre acesso à jurisdição como direito fundamental positivado no artigo 5º, inciso XXXV, com o fito de efetivar a concretização dos direitos dos cidadãos. No entanto, há casos em que a controvérsia depende de rápida solução do conflito, tais como os que concernem à disciplina e às competições desportivas. Neste cenário, a Constituição condicionou o acesso ao Poder Judiciário ao esgotamento da Justiça Desportiva, objetivando proporcionar decisões mais céleres e adequadas ao âmbito esportivo. Contudo, essa imposição constitucional gerou debates quanto à possível contradição existente com o princípio do livre acesso à jurisdição, mormente porque não é mais aceito o estabelecimento de instâncias administrativas de cunho forçado. Sob essa perspectiva, este estudo buscou investigar, de forma geral, se a inafastabilidade de jurisdição é compatível ou não com a necessidade de exaurimento das instâncias desportivas para acesso ao Judiciário. Para tanto, a metodologia utilizada consistiu na consulta à legislação vigente, à doutrina e à jurisprudência dos tribunais. Além disso, para a análise do problema, objetivou-se compreender, de forma específica, se duas normas constitucionais originárias podem ser reputadas contraditórias e qual o principal objetivo do princípio do livre acesso à jurisdição. Atingidos esses objetivos, constatou-se que não há falar em qualquer contrariedade entre o princípio do livre acesso à jurisdição e a necessidade de exaurimento das instâncias desportivas para o acesso ao Judiciário, mas mero reconhecimento da Justiça Desportiva como o método ideal de solução dos conflitos atinentes à disciplina e às competições desportivas.
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