A ANTROPOMORFIZAÇÃO DOS ANIMAIS DOMÉSTICOS E O REGISTRO DE “NASCIMENTO” E GUARDA EM CARTÓRIO COMO (MAIS) UMA EXPRESSÃO DA FAMÍLIA MULTIESPÉCIE

Autores

DOI:

https://doi.org/10.20873/uft.2359-0106.2022.v9n1.p367-390

Palavras-chave:

Antropomorfização dos animais domésticos, família multiespécie, PetLegal

Resumo

O fenômeno da antropomorfização dos animais domésticos é uma realidade hodierna e são várias suas manifestações, desde a opção por alimentação vegana, passando pela escolha do “guarda-roupa e vestuário”, a medicalização de doenças, até o registro dos pets no cartório do Registro de Títulos e Documentos. Essa “humanização” ou o ato de conferir aos pets características e sentimentos humanos se acentuou nas últimas décadas por razões ligadas à própria subjetividade dos tutores, à mudança de paradigma em relação aos animais – de coisa, propriedade ao afeto - e à constituição de um novo tipo de família. O presente artigo defende que a antropomorfização, não obstante os seus excessos, é própria da sociedade humana pós-moderna e contribui para que se estabeleça a família multiespécie, considerando-se uma concepção de antropocentrismo “alargado” em relação aos animais não humanos. No campo jurídico civil-registral, a possibilidade do registro dos animais domésticos em documento realizado junto ao Registro de Títulos de Documentos reconhece expressamente a família multiespécie, o que se constitui em inegável avanço jurídico. O PetLegal, lançado em agosto de 2017, é um procedimento extrajudicial que serviu de modelo ao Registro de Títulos e Documentos, em que há a emissão de uma “certidão de nascimento e guarda” para os animais domésticos, na qual constarão os dados de identificação do animal e que servirá em eventual busca de animais perdidos ou roubados ou como prova em processos judiciais pela guarda do pet.  Trata-se de um meio de prova legal dos direitos dos tutores e, junto com a recente Lei 14.064/20, estabelece maior proteção aos animais no direito brasileiro, enquanto não se reconhece - caminho irreversível – a personalidade jurídica aos animais.

Biografia do Autor

Simone Hegele Bolson, Universidade Federal da Bahia

Doutora em Ciências Jurídicas e Sociais – PPGSD/UFF, mestre em Instituições Jurídico-Políticas – PPGD/UFSC, especialista em Direito Ambiental e Direito do Consumidor - PPGD-UFRGS, bacharel em História – PUCRS, professora do Departamento de Direito Privado da Faculdade de Direito – UFBA, tabeliã de notas e protesto no estado da Bahia.

Solano Hegele Bolson, UNEB

Bacharel em Administração, com ênfase em Comércio Internacional – Faculdade de Administração – PUCRS; graduando em Direito – UNEB – campus Valença (BA), tabelião substituto no estado da Bahia.

Referências

ANOREG. Cartórios de sete Estados já emitem registro de animais de estimação. Disponível em: https://www.anoreg.org.br/site/2017/08/07/cartorios-de-sete-estados-ja-emitem-registro-de-animais-de-estimacao. Acesso em 19/01/2021. Acesso em 20.mai.2021.

BAKOS, Margareth Marchiori. Fatos e mitos do antigo Egito. Porto Alegre: EdiPUCRS, 2009.

BELCHIOR, Germana Parente Neiva. Os animais de estimação como membros do agrupamento familiar. Revista Brasileira de Direito Animal. Salvador, v. 15, n. 3, set./ dez. 2020.

BRASIL. Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros públicos, e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6015.htm>. Acesso em: 15 jan. 2022.

______. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão de decisão em dissolução de união estável Recurso Especial nº 1713167 SP 2017/0239804-9, Quarta Turma, relator: ministro Luis Felipe Salomão, jun. 2018. Disponível em: http://www.stj.jus.br. Acesso em: 15 jan. 2022.

CASTRO JÚNIOR, Marco Aurélio; VITAL, Aline de Oliveira. Direito dos animais e a

garantia constitucional de vedação à crueldade. Revista Brasileira de Direito Animal. Salvador, v.10, n.18, jan.-abr. 2015.

CONHEÇA os pet influencers que faturam até R$ 80 mil por mês. Folha de São Paulo on-line, 20. mar. 2021. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mpme/2021/03/conheca-os-pet-influencers-que-faturam-ate-r-80-mil-por-mes.shtml . Acesso em 15.jan. 2022.

CHAVES, Marianna. Disputa de guarda de animais de companhia em sede de divórcio e dissolução de união estável: reconhecimento da família multiespécie? Revista de Direito UNIFACS, Salvador, 2018. Disponível em: https://revistas.unifacs.br/index.php/redu/article/view/4066/2788. Acesso em: 15 jan. 2022.

DOMITH, Laira Carone Rachid. A humanização da animalidade forjando a alteração da teoria geral do direito civil – animais não humanos enquanto sujeitos de direitos no contexto das famílias multiespécie. In: FIUZA, César Augusto de Castro; RIBEIRO NETO, João Costa; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz Rodrigues (coord.). Direito civil contemporâneo [Recurso eletrônico on-line], Florianópolis: CONPEDI, 2017.

FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: famílias/ Cristiano Chaves de Farias, Nelson Rosenvald - 9. ed. ver., ampl. e atual, Salvador: JusPodivm, 2016.

FIORILLO, Celso Antônio Pacheco; FERREIRA, Renata Marques. Tutela jurídica dos animais de estimação em face do direito constitucional brasileiro. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2019.

GAEDTKE, Kênia Mara. Quem não tem filho caça com cão: animais de estimação e as configurações sociais de cuidado e afeto. Tese (Doutorado em Sociologia Política) - Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política – UFSC, 2017, 198 p.

GAIGHER, Lívia Bósio et al. A era da afirmação dos direitos dos animais no cenário global e seu fundamento na solidariedade entre espécies. Revista Brasileira de Direito Animal, Salvador, vol. 13, n. 02, mai.-ago. 2018.

GORDILHO, Heron Santana. Abolicionismo animal: habeas corpus para os grandes primatas. 2.ª ed. Salvador: Edufba, 2017.

LOPES, João Marques. Saramago: Biografia. São Paulo: Leya, 2010.

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Registros Públicos: teoria e prática. 3ª ed. São Paulo: Método, 2017.

OLIVEIRA, Micheline Ramos de; SOUZA, Maria Claudia Silva Antunes de; CARLETTO, Sheila. Um olhar antropológico sobre o especismo e movimentos de defesa dos animais. Revista Brasileira de Direito Animal, Salvador, vol. 11, n. 23, set.-dez.2016.

OSÓRIO, Andréa. Guloseimas para animais de estimação: comensalidade, afeto e antropomorfismo. Mediações, Londrina, v. 24, n. 3, set./dez. 2019.

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito das famílias. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

PESSANHA, Lavínia; CARVALHO, Roberto. Famílias, animais de estimação e consumo: um estudo do marketing dirigido aos proprietários de animais de estimação. Signos do consumo, São Paulo, v.6, n.2, 2014, dez. 2014.

REGAN, Tom. Jaulas vazias. Porto Alegre: Lugano, 2006.

SEGUIN, Élida; ARAÚJO, Luciane Martins de; CORDEIRO NETO, Miguel Reis. Uma nova família: a multiespécie. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, v.82, abr.-jun. 2016.

SAKUMA, Regina Harumi. O mercado pet e a objetificação dos animais de estimação: o desejo de consumo sob a perspectiva do budismo. XXII Congresso Metodista do Pós-graduação lato sensu em Ciência da Religião, Metodista, 2020.

SERRES, Michel. O contrato natural. Trad. Beatriz Sidoux. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1991.

SINGER, Peter. Libertação Animal. Trad. Marly Winckler; revi¬são técnica Rita Paixão. Porto Alegre, RS: Lugano, 2004.

Downloads

Publicado

2022-07-04

Como Citar

Hegele Bolson, S., & Hegele Bolson, S. (2022). A ANTROPOMORFIZAÇÃO DOS ANIMAIS DOMÉSTICOS E O REGISTRO DE “NASCIMENTO” E GUARDA EM CARTÓRIO COMO (MAIS) UMA EXPRESSÃO DA FAMÍLIA MULTIESPÉCIE. Revista Vertentes Do Direito, 9(1), 367–390. https://doi.org/10.20873/uft.2359-0106.2022.v9n1.p367-390

Edição

Seção

Artigo Científico