“Sem corpo não há rito, não há nada”:
as vozes narrativas e o espaço em K. Relato de uma busca, de Bernardo Kucinski
DOI:
https://doi.org/10.20873.24.404Palavras-chave:
Testemunho;, K. Relato de uma Busca, Luto.Resumo
No romance K. Relato de uma busca (2011), de Bernardo Kucinski, evidencia-se a iminência do testemunho – o que também implica a ameaça de sua impossibilidade (SELIGMANN-SILVA, 2008) –, além de um trabalho infindo de luto de um corpo ausente. Nesse sentido, a obra, diante da perda como eixo fundamental, apresenta formas específicas de contar a realidade inenarrável, de modo que esse testemunho lutuoso, emergente da necessidade/impossibilidade da narração, manifesta-se, sobretudo, na representação das vozes e no espaço da narrativa. Objetiva-se, nessa perspectiva, a partir das compreensões sobre testemunho, revelar como a tensão impossibilidade/necessidade impulsiona a composição do narrador e do espaço em K. Relato de uma busca. Outrossim, como objetivos específicos, enseja-se analisar como o conflito das vozes narrativas em K constrói a representação da violência e a verdade dos eventos traumáticos; bem como investigar como o espaço traça a amplitude do luto da personagem. Em síntese, o romance apresenta não só, metalinguisticamente, os abismos da criação literária, mas também especificidades nos elementos da narrativa diante da perda: seja no espaço revelando as dimensões da ausência, seja em vozes elipsadas. Nessa última, realça-se que a impossibilidade de narrar a experiência traumática, aspecto indispensável da narrativa testemunhal, mobiliza as várias outras vozes (tentacularidade), acionando outros narradores. A memória protética, isto é, a apropriação de memórias do outro, suplementa a verdade inenarrável e contribui na composição da obra.
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