A PERDA DA AUTORIDADE DO NARRADOR COMO RECURSO FORMAL NA REPRESENTAÇÃO DA VIOLÊNCIA EM K. – RELATO DE UMA BUSCA, DE BERNARDO KUCINSKI

Autores

  • Adão Marcelo Lima Freire Alves Universidade Estadual do Piauí

DOI:

https://doi.org/10.20873/uft2179-3948.2021v12n1p102-117

Palavras-chave:

Perda da autoridade do narrador, Violência, Teor testemunhal

Resumo

Este artigo defende a hipótese de que a obra K. – relato de uma busca, de Bernardo Kucinski, promove a perda da autoridade do narrador onisciente como recurso formal na representação da violência do regime militar de 1964-1985. Apontamos dois elementos estruturantes na obra: a autoridade do narrador e o teor testemunhal do romance. Para tanto, realizamos a verificação dos recursos estéticos utilizados na obra. A fim de compreender a relação entre autoridade, violência e poder, discutimos as ideias de Arendt (2016, 2020), Benjamin (1986) e Agamben (2004). Em interlocução com Seligmann-Silva (2008, 2010), cunhamos o conceito de “teor testemunhal” para entender a relação entre testemunho e ficção. Benjamin (2012) possibilitou uma leitura a contrapelo da narrativa, ao tempo em que também permitiu um olhar crítico sobre a história do progresso como acúmulo de catástrofes. Na análise do romance, verificamos que a perda da autoridade do narrador externo provoca uma percepção renovada das cenas de violências, pois, ao acompanhar a apresentação dos fatos sob a lente dos narradores em primeira pessoa, o leitor tem uma visão “de dentro” dos acontecimentos. A alternância de foco narrativo – ora externo, ora interno – também promove uma perspectiva multifacetada da representação da violência.

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Publicado

2021-06-12

Como Citar

Lima Freire Alves, A. M. (2021). A PERDA DA AUTORIDADE DO NARRADOR COMO RECURSO FORMAL NA REPRESENTAÇÃO DA VIOLÊNCIA EM K. – RELATO DE UMA BUSCA, DE BERNARDO KUCINSKI. EntreLetras, 12(1), 102–117. https://doi.org/10.20873/uft2179-3948.2021v12n1p102-117