Revista Brasileira de Educação do Campo
The Brazilian Scientific Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e9068
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
1
Este conteúdo utiliza a Licença Creative Commons Attribution 4.0 International License
Open Access. This content is licensed under a Creative Commons attribution-type BY
Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre
a inclusão educacional no interior do Espírito Santo
Andressa Dias Koehler
2
, Taiane Christo Chaga
2
, Lucimar Aparecida Stein Kuster
3
1, 2, 3
Universidade Federal do Espírito Santo - UFES. Departamento de Linguagens, Cultura e Educação (DLCE). Avenida
Fernando Ferrari, 514, Goiabeiras. Vitória - ES. Brasil.
Autor para correspondência/Author for correspondence: andressadk@gmail.com
RESUMO. Este estudo problematiza a educação especial
desenvolvida em escolas do campo com base em uma pesquisa
exploratória, realizada por meio de um questionário
semiestruturado, aplicado a professores de duas escolas do
campo situadas no interior do estado do Espírito Santo. Busca
analisar como tem acontecido a inclusão de estudantes público-
alvo da educação especial nessas instituições a partir do
depoimento dos docentes. Constata que alguns impasses dessas
escolas quanto à inclusão desse público são semelhantes ao que
se verifica em contextos urbanos, por exemplo, quanto à
formação de professores e à necessidade de investimentos
públicos. Todavia, quando somados às realidades geográficas,
sociais e culturais do contexto campesino, percebe-se a
necessidade de um olhar mais aplicado à educação especial
no/do campo, para se pensar em um atendimento educacional
especializado e uma formação de professores articulada às
realidades locais dos pequenos agricultores, quilombolas, povos
indígenas, pescadores, assentados, ribeirinhos, lavradores, sem-
terra e de todos os demais que vivem no e do campo.
Palavras-chave: Educação Especial, Educação do Campo,
Educação Especial no Campo.
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
2
Special Education in rural schools: a clipping about the
educational inclusion in the interior of the state of Espírito
Santo
ABSTRACT.
This study discusses the special education
developed in rural schools from exploratory research made by
means of a semi-structured questionnaire applied to teachers of
two rural schools, located in the interior of the State of Espírito
Santo. The study aims to analyse how has occurred the inclusion
of the target students of the special education in these
institutions based on testimony of the teachers. The research
reveals that some impasses of these schools in relation to
inclusion this target group are similar to urban context, for
example, in the formation of teachers and need of public
investment. However, when are added the geographical, social
and cultural realities in the campesino context, there is a need of
a look more applied to special education in rural schools,
thinking about a specialized educational attendance and
formation of articulated teachers to local realities of small
farmers, quilombolas, Indian communities, fishemen, squatters,
riverside communities, farm workers, landless workers and
everyone else who lives in the countryside.
Keywords: Special Education, Rural Education, Special
Education in Rural Areas.
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
3
Educación Especial en escuelas en el campo: un corte en la
inclusión educativa en el interior del Espírito Santo
RESUMEN. Este estudio problematiza la educación especial
desarrollada en escuelas rurales basada en una investigación
exploratoria, realizada a través de un cuestionario
semiestructurado aplicado a maestros de dos escuelas rurales
ubicadas en el interior del estado de Espírito Santo. Busca
analizar cómo se ha llevado a cabo la inclusión de estudiantes
que apuntan a la educación especial en estas instituciones con
base en los testimonios de los docentes. Se encuentra que
algunos impases de estas escuelas con respecto a la inclusión de
este público son similares a lo que se verifica en contextos
urbanos, por ejemplo, con respecto a la capacitación de maestros
y la necesidad de inversiones públicas. Sin embargo, cuando se
agrega a las realidades geográficas, sociales y culturales del
contexto rural, existe la necesidad de una mirada más aplicada a
la educación especial en/desde el campo, con el fin de pensar en
la asistencia educativa especializada y la capacitación docente
vinculada a las realidades locales pequeños agricultores,
quilombolas, pueblos indígenas, pescadores, colonos, habitantes
de la ribera, agricultores, personas sin tierra y todos los demás
que viven en el campo.
Palabras clave: Educación Especial, Educación Rural,
Educación Especial en el Campo.
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
4
Introdução
O debate sobre a inclusão de
crianças, jovens e adultos público-alvo da
educação especial (PAEE) na escola
regular se fortaleceu nas últimas três
décadas, tanto na academia quanto nas
instituições de ensino básico. Estudos
científicos, em grande parte realizados em
contextos urbanos, trazem à tona a angústia
de profissionais que reclamam da carência
de formação acadêmica para trabalhar com
esses estudantes em sala de aula. Um
impasse semelhante ao que se vive hoje em
escolas do campo, porém com
especificidades impostas pelo contexto -
cultural, geográfico e social - que
dificultam o acesso da população
campesina à concretização das promessas
de inclusão veiculadas em documentos
oficiais.
Por exemplo, a Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva (PNEEPEI) é clara
quando estabelece que: “Para atuar na
educação especial, o professor deve ter
como base da sua formação, inicial e
continuada, conhecimentos gerais para o
exercício da docência e conhecimentos
específicos da área”. (Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva de 2008, p. 17).
Portanto, em uma visão legalista, todo
professor, do campo ou da cidade, deveria
ter acesso à formação para nortear o
processo de ensino e aprendizagem de
estudantes PAEE, o que sabemos, nem
sempre ocorre.
Vejo que os professores têm boa
vontade. O que falta é a viabilização de
recursos, profissionais e formação. A lei
precisa acontecer na prática”, afirmou um
professor que atuava em uma escola do
campo do Espírito Santo na ocasião deste
estudo. A fala do profissional robustece o
entendimento desta pesquisa no sentido de
que, para se tratar do trabalho docente na
inclusão de estudantes público-alvo da
educação especial, é elementar e
indissociável considerar a formação inicial
do professor, a formação continuada e as
condições objetivas de trabalho. Convém
explicar que a concepção de público-alvo
da educação especial adotada neste texto
está em conformidade com a PNEEPEI,
segundo a qual pertencem a esse grupo “...
os estudantes com deficiência, transtornos
globais do desenvolvimento e altas
habilidades/superdotação”. (Política
Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva de
2008, p. 7).
E, se por um lado, os documentos
oficiais que tratam da inclusão nas escolas
não fazem distinção entre os contextos
urbano e campesino, por que seria
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
5
substancial fazermos esse recorte nesta
coletânea de textos? Convidando Brandão
(2007) para este diálogo, em seu livro O
que é Educação? O autor reforça que a
educação é “inevitavelmente uma prática
social que, por meio da inculcação de tipos
de saber, reproduz tipos de sujeitos
sociais”. (p. 71). E que, como tal, ela atua
sobre a vida e o crescimento da sociedade
“no desenvolvimento de suas forças
produtivas” e “no desenvolvimento de seus
valores culturais”. (p. 71). Por outro lado,
ele ressalva que
... o surgimento de tipos de educação
e a sua evolução dependem da
presença de fatores sociais
determinantes - e do
desenvolvimento deles, de suas
transformações. A maneira como os
homens se organizam para produzir
os bens com que reproduzem a vida,
a forma de ordem social que
constroem para conviver, o modo
como tipos diferentes de sujeitos
ocupam diferentes posições sociais,
tudo isso determina o repertório de
ideias e o conjunto de normas com
que uma sociedade rege a sua vida.
Determina também como e para quê
este ou aquele tipo de educação é
pensado, criado e posto a funcionar.
(Brandão, 2007, p. 75).
Ora, se diferentes tipos de
educação conforme os fatores sociais
determinantes, como e para quê a educação
do campo é pensada? Segundo Caldart,
O nome ou expressão educação do
campo já identifica também uma
reflexão pedagógica que nasce das
diversas práticas de educação
desenvolvidas no campo e ou pelos
sujeitos do campo. É uma reflexão
que reconhece o campo como lugar
onde não apenas se reproduz, mas
também se produz pedagogia;
reflexão que desenha traços do que
pode se constituir como um projeto
de educação ou de formação do
sujeito do campo. (2002, p. 22).
Sendo o campo um lugar que produz
pedagogia e que demanda um projeto de
educação delineado ao encontro das
condições e interesses dos sujeitos
campesinos, supõe-se que a inclusão de
estudantes com deficiência desse/nesse
contexto também necessita, em diálogo
com as políticas estabelecidas em
documentos oficiais, articular o
atendimento e o processo de ensino e
aprendizagem desses sujeitos às suas
realidades de vida. Isso inclui pensar em
planejamentos que considerem os
contextos de distâncias geográficas, modos
de subsistência das famílias, aspectos
culturais e condições materiais para que os
atendimentos especializados realizados
pelas escolas tenham desdobramentos para
além desses espaços.
Feitas essas premissas, o presente
estudo problematiza a educação especial
desenvolvida em escolas do campo com
base em uma pesquisa exploratória
realizada por meio de um questionário
semiestruturado, aplicado a professores de
duas escolas campesinas situadas no
município de Domingos Martins, Espírito
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
6
Santo. Busca, portanto, analisar como tem
acontecido a inclusão de estudantes PAEE
nessas instituições sob a ótica dos
docentes. Dentre os objetivos específicos,
estão: a) Compreender quais
entendimentos que professores das escolas
do campo pesquisadas m sobre a Política
Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva e o que
pensam sobre a inclusão de estudantes com
deficiência na escola regular; b) Verificar
se os docentes dessas escolas possuem
formação nas áreas de educação especial e
educação inclusiva; c) Entender como
esses profissionais, com ou sem formação
nessas áreas, avaliam o próprio trabalho no
aspecto inclusivo.
Os dados são analisados
qualitativamente com base nas reflexões
pautadas por autores, como: Cury (2016),
que discute sobre a educação inclusiva e a
educação especial, fazendo um histórico da
transição entre as fases de segregação,
integração e inclusão; Caldart (2012), que
aponta para a necessidade de se pensar em
uma educação do campo que considere a
cultura e a identidade das pessoas que lá
vivem, uma educação dos e não para os
sujeitos do campo; Freire (2012), que
aborda a formação do professor
pesquisador que, numa postura crítica e
reflexiva, considera as identidades e
contradições dos estudantes, visando à
elaboração de um trabalho que promova a
transformação da realidade. Além disso,
este estudo está ancorado em definições
propostas pela Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva (2008), que define o
público-alvo da educação especial, trata da
disponibilização de recursos e serviços
para o atendimento educacional
especializado, dentre outros fatores;
A pesquisa foi desenvolvida no
âmbito da Licenciatura em Educação do
Campo da Universidade Federal do
Espírito Santo, entre acadêmicos e
professores, como uma ação do grupo de
pesquisa Leitura e Acessibilidade (Leia),
durante o ano de 2019, e busca ampliar o
entendimento que se tem sobre o cenário
de inclusão em escolas do campo na
realidade local.
Considerações a respeito da educação
inclusiva e da educação especial em
escolas do campo
A educação inclusiva tem como
princípio, segundo Cury (2016), a
escolarização dos sujeitos sem nenhuma
forma de discriminação por sexo, raça,
etnia, religiosa e capacidade, junto com
seus pares, com direito de estarem nos
mesmos estabelecimentos e participarem
das atividades da maioria dos estudantes da
mesma idade, com os ajustes necessários
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
7
para o bem-estar e a permanência desses
sujeitos no ambiente escolar.
Nesse sentido, a educação do campo,
desde sua nese junto às práticas
pedagógicas próprias de sujeitos
camponeses e dos movimentos sociais
organizados, construiu suas estruturas
sobre uma base de perspectiva inclusiva,
uma vez que reúne pequenos agricultores,
quilombolas, povos indígenas, pescadores,
assentados, ribeirinhos, lavradores, sem-
terra, agregados, caboclos, meeiros, boia-
fria, entre outros, tendo como referência
sua identidade e sua cultura.
Isso não pressupõe, todavia, que a
educação especial tenha florescido nas
escolas do campo no mesmo ritmo que a
inclusão de todos esses povos, uma vez
que a história da inclusão de pessoas com
deficiência nas instituições regulares de
ensino ainda é narrada hegemonicamente
sob ponto de vista urbano. Apesar de o
artigo da Constituição de 1988 afirmar
como um dos objetivos fundamentais da
República Federativa do Brasil a promoção
do bem de todos, sem preconceitos de
origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação, quando se
trata de sujeitos com deficiências, estes
permaneceram segregados da sociedade,
sem direito a frequentar escolas regulares e
outros espaços públicos durante muito
tempo. Foram denominados anormais,
atrasados, inadaptados, débeis, entre outros
nomes pejorativos (Cury, 2016).
Foi durante o século XX que ocorreu
a transição da fase de segregação para a
fase de integração, quando se compreendeu
que esse público deveria frequentar os
estabelecimentos de ensino comuns ou
instituições especializadas, porém tendo
que se adaptar às regras da sociedade
dominante (Cury, 2016).
Atualmente, a sociedade, em especial
a educação, tenta desconstruir práticas de
segregação e de integração a fim de
instituir uma inclusão que visa não apenas
à permanência das crianças e adolescentes
com deficiência na escola, mas a sua total
participação nas atividades escolares e na
vida social como cidadãos de direito. Um
processo desafiador que envolve “... os
limites de uma formação de docentes
pouco atenta a tais demandas, para as quais
o professor é um sujeito essencial”. (Cury,
2016, p. 21).
Essa lacuna nas formações inicial e
continuada acentua a inquietação de
professores que postulam não se sentir
preparados para oferecer o atendimento
adequado aos estudantes com deficiência,
uma vez que é necessário um olhar atento
às especificidades de cada um. E,
conforme Cury (2016), “... a equidade é,
pois, a adequação prudente, dentro de um
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
8
contexto, da lei universal em vista de
situações específicas”. (p. 23).
Convém destacar que, anterior à
implementação de algumas políticas no
Brasil, a Declaração de Salamanca, em
1994, apregoava a inclusão dos
estudantes com deficiência nas escolas
com uma educação de qualidade para
todos, passando a ser reconhecida nacional
e internacionalmente por nortear a
educação inclusiva.
Segundo o art. 58 da Lei de
Diretrizes e Bases - Lei 9394/96, entende-
se por educação especial a modalidade de
educação escolar oferecida
preferencialmente na rede regular de
ensino, para educandos com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e
altas habilidades ou superdotação,
considerados público-alvo da educação
especial.
É nessa perspectiva que surge a
Política Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva (2008),
criada pelo Ministério da
Educação/Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização, Diversidade e
Inclusão, um documento que “...
acompanha os avanços do conhecimento e
das lutas sociais, visando constituir
políticas públicas promotoras de uma
educação de qualidade para todos os
estudantes” (Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva de 2008, p. 7). O texto
afirma que:
A partir da visão dos direitos
humanos e do conceito de cidadania
fundamentado no reconhecimento
das diferenças e na participação dos
sujeitos, decorre uma identificação
dos mecanismos e processos de
hierarquização que operam na
regulação e produção das
desigualdades. Essa problematização
explicita os processos normativos de
distinção dos estudantes em razão de
características intelectuais, físicas,
culturais, sociais e linguísticas, entre
outras, estruturantes do modelo
tradicional de educação escolar.
(Política Nacional de Educação
Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva de 2008, p. 7).
A partir dessa Política, a educação
especial passou a ser ofertada não mais
apartada da escola regular, mas articulada
ao cotidiano desta, com o intuito de
garantir recursos e serviços que visem à
plena aprendizagem do estudante PAEE na
classe comum, por meio do atendimento
educacional especializado (AEE). Sobre
isso, o texto estabelece que:
O atendimento educacional
especializado tem como função
identificar, elaborar e organizar
recursos pedagógicos e de
acessibilidade que eliminem as
barreiras para a plena participação
dos estudantes, considerando suas
necessidades específicas. As
atividades desenvolvidas no AEE
diferenciam-se daquelas realizadas na
sala de aula comum, não sendo
substitutivas à escolarização. Esse
atendimento complementa e/ou
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
9
suplementa a formação dos
estudantes com vistas à autonomia e
independência na escola e fora dela.
(Política Nacional de Educação
Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva de 2008, p. 9).
Assim, não havendo na Política
distinção de tratamento entre escolas
urbanas ou campesinas, subentende-se que
o atendimento educacional especializado,
de caráter complementar e suplementar à
formação dos estudantes, deve se estender
a todos os estudantes que dele necessitem
ou que fazem parte do público estabelecido
em lei, sejam eles provenientes do campo
ou da cidade.
Atualmente, já é possível afirmar que
houve um pequeno avanço no que diz
respeito às matrículas desses estudantes.
Segundo dados do Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas (INEP), a população
brasileira, em 2018, estimava o número de
208.494.900 habitantes no País. Desse
quantitativo, 48.447.991 estudantes
estavam matriculados na Educação Básica,
nas redes pública federais, municipais e
estaduais e na rede privada, representando
um percentual de 23,24%. E
aproximadamente 2,44% eram
PAEE. Uma demanda tão grande nos
sinaliza o quanto já era inadiável, desde
então, pensar a acessibilidade nas diversas
dimensões possíveis: arquitetônica,
atitudinal, comunicacional, programática,
instrumental e tecnológica. Isso pressupõe
uma série de medidas, como prédios
acessíveis, formação para todos os
profissionais que atuam na área da
educação, materiais pedagógicos acessíveis
e políticas públicas que cheguem a todos
os locais, principalmente onde a educação
em sua forma institucionalizada foi
historicamente invisibilizada, como no
campo.
Ainda, segundo a PNEEPEI, uma
escola inclusiva precisa praticar: “... uma
ação pedagógica processual e formativa
que analisa o desempenho do aluno em
relação ao seu progresso individual,
prevalecendo na avaliação os aspectos
qualitativos que indiquem as intervenções
pedagógicas do professor”. (Política
Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva de
2008, p. 13).
Isto posto, os profissionais, seja do
campo ou da cidade, são também
convocados a exercer seu protagonismo no
processo de inclusão desses estudantes;
não mais uma integração ou inclusão que
se restrinja ao espaço físico, mas uma
inclusão que permita o engajamento desses
estudantes na construção coletiva do
conhecimento, como cidadãos de direito e
de deveres, empenhados em modificar o
arcabouço de desigualdades e segregações
arraigado em seus contextos sociais.
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
10
Abordagem teórico-metodológica da
pesquisa
Trata-se de um estudo exploratório,
que teve como foco proporcionar maior
familiaridade com um problema - neste
caso, a realidade da inclusão de estudantes
com deficiência em escolas do campo no
interior do Espírito Santo - e foi
desenvolvido por meio de levantamento
bibliográfico e entrevistas com pessoas
experientes no problema pesquisado (Gil,
2008). Nesse sentido, o estudo exploratório
tende a assumir a forma de pesquisa
bibliográfica e de estudo de caso.
A pesquisa documental priorizou a
leitura de teses e dissertações do banco de
dados do Programa de Pós-Graduação em
Educação (PPGE) e do Mestrado
Profissional e Educação (PPGMPE),
ambos da Universidade Federal do Espírito
Santo (UFES), tendo em vista o interesse
por pesquisar a realidade local.
As entrevistas foram realizadas por
meio de questionário semiestruturado,
aplicado a professores atuantes no ensino
fundamental e na modalidade educação
especial, em duas escolas do campo
situadas no município de Domingos
Martins. Por questões éticas, referenciamos
essas instituições como A e B, e os sujeitos
com letras e números, a fim de preservar o
anonimato.
Apesar de algumas perguntas do
questionário requisitarem respostas
numéricas, este estudo adotou uma
perspectiva de análise qualitativa, tendo
em vista que “... trabalha com o universo
de significados motivos, aspirações,
crenças, valores e atitudes o que
corresponde a um espaço mais profundo
das relações, dos processos e dos
fenômenos que não podem ser reduzidos à
operacionalização de variáveis”. (Minayo,
2002, p. 21-22). Ao realizar a pesquisa
qualitativa, automaticamente fazemos uso
de dados quantitativos, todavia sem fazer
oposição. Além disso, a este estudo não
interessa produzir grande quantidade de
dados, mas compreender e explicar
aspectos da realidade social sobre o que o
professor sabe e pensa em relação à
educação inclusiva.
Participaram da pesquisa 15
professores da escola A e 16 da escola B,
que responderam a questões sobre: o
tempo de atuação deles na Educação, a
formação inicial, a quantidade de escolas
onde atuavam, o conhecimento deles a
respeito da Política Nacional de Educação
Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva, a formação na área da Educação
Especial, o trabalho desenvolvido por eles
em sala de aula para possibilitar a inclusão
e a opinião quanto ao que seria necessário
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
11
para melhorar a inclusão nas escolas onde
atuavam.
Todos os participantes leram e
assinaram o Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido (TCLE) entregue após
a anuência dos diretores das escolas para a
realização da pesquisa.
O lócus desta pesquisa e as
problemáticas no atendimento
educacional especializado
A escola A está em atividade desde o
ano de 1946, passando por várias
transformações físicas, estruturais e de
nomenclaturas. Atualmente, oferece o
Ensino Fundamental completo e é um
órgão público municipal, gratuito e sem
fins lucrativos. Atende alunos de seis
comunidades próximas diferentes,
pertencentes a várias etnias, mas em sua
maioria descendentes de alemães. Os
estudantes são em boa parte filhos de
caseiros e empregados de condomínios e
sítios da região. Outros são filhos de
funcionários do comércio local,
funcionários públicos, diaristas e
construtores.
A escola B, localizada a uma
distância de 29 km da escola A, também
atende alunos descentes de alemães devido
à imigração ocorrida na segunda metade do
século XIX. A história da educação nessa
comunidade começou de maneira formal
em 1953, atendendo 55 estudantes em uma
única sala de aula e com uma única
professora, que também era responsável
por cozinhar a merenda e manter limpo o
espaço escolar. Atualmente, após rias
mudanças na estrutura sica e também nas
nomenclaturas, a escola atende 183
estudantes, da Educação Infantil ao Ensino
Fundamental, provenientes de seis
comunidades.
Em comum, está o fato de ambas
estarem localizadas na área rural da região
sul do Espírito Santo e atenderem
estudantes filhos de produtores rurais e
assalariados. A maioria das crianças e
jovens faz uso de transporte escolar, pelo
fato de suas residências serem distantes da
escola. Ambas as escolas possuem
conselho escolar ativo, com a participação
efetiva de toda comunidade escolar, pais,
estudantes, funcionários, setor pedagógico
e administrativo, além de membros da
comunidade.
Ademais, têm em comum o fato de
atenderem, em 2019, quatro alunos
público-alvo da educação especial, cada
uma. Durante o ano letivo, não houve
atendimento educacional especializado a
eles no contraturno devido a questões
logísticas, uma vez que as crianças
dependiam de transporte escolar para
almoçar em suas casas, que eram distantes,
e não tinham como retornar à escola no
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
12
contraturno. Por tal motivo, sequer foi
contratado professor para oferecer o AEE.
Paralelo a isso, ambas preveem em
seus projetos políticos pedagógicos (PPP)
objetivos quanto ao público-alvo da
Educação Especial. A escola A, por
exemplo, cita como meta:
Garantir a sala do AEE aos alunos
com deficiência (física, mental ou
sensorial, intelectual, transtornos
globais do desenvolvimento, aos que
apresentam quadro de alterações no
desenvolvimento neuropsicomotor,
comprometimento nas relações
sociais, na comunicação ou
estereotipias motoras, alunos com
autismo clássico, síndrome de
Asperger, síndrome de Rett,
transtorno desintegrativo da infância
(psicoses) e transtornos invasivos
sem outra especificação, alunos com
altas habilidades/superdotação (PPP
da escola A).
Enquanto o PPP da escola B
menciona:
Promover um atendimento
diferenciado aos alunos com
necessidades especiais de educação;
Sensibilizar os estudantes,
funcionários e corpo docente da
importância da Inclusão Social dos
alunos com necessidades especiais
em educação;
Reforçar o olhar do educador para as
dificuldades encaradas sob o ponto
de vista educacional, isto é, conhecer
a avaliação, o planejamento, enfim
como desenvolver o processo
educacional com os estudantes com
necessidades especiais de educação;
Avaliar de forma a valorizar as
experiências vivenciadas,
reconhecendo as dificuldades e
realizando um trabalho cooperativo
entre professores, auxiliares e
estudantes (PPP da escola B).
Ora, é sabido que a realidade dos
estudantes provenientes do campo carrega
consigo, para além das questões
identitárias, históricas, culturais e
pedagógicas, questões geográficas que
tornam o acesso à escola mais complexo
devido às longas distâncias e também às
condições das estradas e dos transportes, o
que pode interferir na frequência dos
estudantes. Essas questões refletem
diretamente na oferta do atendimento
educacional especializado por essas
instituições, tendo em vista que os
estudantes muitas vezes não dispõem de
suporte para frequentarem o atendimento
no contraturno, pois para isso dependeriam
de outras refeições escolares, professor de
Educação Especial para oferecer o AEE no
contraturno e transporte escolar para voltar
as suas residências. Todavia, até o
momento de conclusão desta pesquisa,
ambas as escolas ainda não dispunham de
soluções para que esse atendimento fosse
efetivado.
Tem-se, portanto, uma lacuna entre o
que é proposto pela PNEEPEI e o que é
possível oferecer no contexto dessas duas
escolas do campo, o que por certo se
estende a outras de realidade semelhante.
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
13
Por que pensar na educação especial no
contexto campesino?
Sabe-se que o povo campesino é
caracterizado pelo jeito típico com que as
pessoas se relacionam com a terra, com a
natureza, com o meio ambiente, com a
família e com a comunidade.
Historicamente, trata-se de uma população
que sempre foi vítima de preconceitos,
reputada muitas vezes como atrasada, sem
cultura, sem educação ou sem uma
identidade própria. Essa visão
preconceituosa demanda um esforço dos
povos campesinos por resistir e lutar pelo
reconhecimento de sua cidadania, de sua
cultura, e do seu papel de ser e estar no
mundo e por uma educação que atenda aos
anseios das comunidades.
De acordo com Caldart (2012), foi
no I encontro de Educadores e Educadoras
da Reforma Agrária (Enera), realizado
pelos movimentos dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra (MST) em julho de
1997, que as discussões sobre educação do
campo foram oficialmente iniciadas. A
partir disso, foi realizada a I Conferência
Nacional por uma Educação Básica do
Campo, em Luziânia, Goiás, no período de
27 a 30 de julho de 1998. Em 2002, foi
realizado em Brasília o Seminário
Nacional por uma Educação Campo, no
período de 26 a 29 de novembro; a partir
deste, houve a mudança da nomenclatura
Educação Básica do Campo, passando a
ser denominada Educação do Campo, o
que foi reafirmado na II Conferência
Nacional, realizada em julho de 2004.
De acordo com Caldart (2002),
durante o seminário, foram estudados
contextos e perspectivas do povo
campesino; foi analisado como vêm sendo
construídas e implementadas as políticas
públicas para o povo do campo em todo
território brasileiro; foram observadas as
Diretrizes Operacionais para a Educação
Básica nas Escolas do Campo e discutidas
as suas práticas; e, ainda, foi relembrada a
trajetória desse movimento por uma
educação do campo. Além disso, foram
coletivizadas experiências de construção
de escolas do campo e discutidos os
desafios e próximos passos, dando
oportunidade à participação de todas as
organizações presentes de expor seus
pensamentos e considerações.
Cumpre reforçar que a escola é um
espaço dinâmico, de formação coletiva e
política dos sujeitos e que, dentre as várias
atribuições, está a socialização dos saberes
aprendidos ao longo do tempo e dos
processos de produção de conhecimento.
Porém, para aqueles que vivem no/do
campo, é também um espaço de luta e
resistência.
Para Caldart (2002), a luta deve
ocorrer no campo das políticas públicas,
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
14
porque esta é a única maneira de garantir o
acesso à educação para toda a população.
Diante das peculiaridades do povo
campesino, a educação do campo precisa
ser direcionada para práticas educativas e
pedagógicas que estejam de acordo com a
realidade da população campesina, levando
em consideração a cultura e a identidade
das pessoas que vivem. “Trata-se de
uma educação dos e não para os sujeitos
do campo. Feita sim através de políticas
públicas, mas construídas com os próprios
sujeitos dos direitos que as exigem”.
(Caldart, 2002, p. 19). Sendo feita por eles
e para eles, para que cada comunidade
tenha um olhar atento para suas próprias
peculiaridades.
Nesse viés, os professores da
educação do campo são considerados
sujeitos em construção, assim como os
estudantes. Por isso, necessidade de que
o professor seja pesquisador, a fim de
conhecer a realidade dos estudantes,
enxergando-os para além das paredes da
sala de aula, com suas identidades e
contradições. É fazendo e se refazendo que
o professor se torna crítico e reflexivo para
a transformação da realidade. Afinal, “...
ninguém educa ninguém, como tão pouco
ninguém se educa a si mesmo: os homens
se educam em comunhão, mediatizados
pelo mundo”. (Freire, 2016. p. 120).
Cabe explicarmos que, quando se
trata de Educação Rural e Educação do
Campo, o que diferencia uma da outra,
segundo Freire (2016), é o fato de a
primeira não traduzir grandes
preocupações com a diversidade dos
sujeitos que vivem no campo e visar à
preparação da mão de obra para o mercado
de trabalho, assim “... insiste em manter
ocultas certas razões que explicam a
maneira como estão sendo os homens no
mundo e, para isto, mistifica a realidade”.
(Freire, 2016, p. 125); enquanto a segunda
busca entender e transformar a realidade
vivida pelos estudantes do campo,
produzindo conhecimento sem apagar suas
identidades, “... comprometida com a
libertação, se empenha na desmitificação.
Por isto, a primeira nega o diálogo,
enquanto a segunda tem nele o selo do ato
cognoscente, desvelador da realidade”.
(Freire, 2016, p. 125).
O sujeito do campo, portanto, tem
muito a contribuir com a educação por suas
experiências de vida individual, coletiva e
de movimentos; além do potencial para
produzir uma pedagogia capaz de cultivar
identidades, valorizar a dignidade humana,
evidenciar as memórias dos sujeitos,
oportunizando ao estudante campesino
visar perspectivas de um futuro mais justo
e igualitário.
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
15
Em relação às escolas do campo no
estado do Espírito Santo e ao número de
professores que nelas atuam, a secretaria
de Estado de Educação do Espírito Santo
(Sedu) apresentou os seguintes dados no
ano de 2012:
Tabela 01 - Caracterização das escolas e dos professores do campo quanto à rede de ensino.
Caracterização
Estaduais
Municipais
Famílias Agrícolas
Escolas
162
1146
16
Professores
1094
5008
149
Professores licenciados
1094
4629
139
Professores com ensino
médio completo
31
375
10
Fonte: PPC da Licenciatura em Educação do Campo da UFES (2018).
Esse relatório apontou para a
existência de 1.324 escolas do campo de
Educação Básica, número que é ampliado
substantivamente se considerada como
escola campesina aquela situada em área
rural ou urbana, desde que atenda
predominantemente às populações
camponesas, conforme determina o
Decreto n.º 7.352/2010. Nessa direção,
esse mesmo levantamento detectou que
... das 258 escolas de Ensino
Fundamental localizadas no
perímetro urbano, mais de 60%
atendem um número significativo de
estudantes provindos das
comunidades camponesas capixabas
e que, em seus Projetos Político-
Pedagógicos, não consideram as
especificidades sociais, culturais,
políticas, econômicas e étnicas desses
sujeitos. (PPC/Ledoc, 2018).
Ou seja, ao tratarmos da inclusão de
pessoas com deficiência em escolas do
campo no Espírito Santo, sob essa
perspectiva do Decreto n.º 7.352/2010,
referimo-nos a quase 80% das escolas do
Estado. Dessa forma, em contraposição à
invisibilidade desse público-alvo nas
pesquisas da Educação, que não costumam
citar o contexto campesino quando se trata
da educação especial, que se pensar na
contradição: se os dados da secretaria
comprovam que os alunos do campo
atendidos pelas escolas do estado
constituem a maioria, por que estes
continuam embaçados nos estudos
acadêmicos que tratam da educação
especial, perpetuando o status de
imperceptibilidade histórica desse público
que vive no campo?
No contexto do Espírito Santo,
identificamos as pesquisas locais
realizadas sobre o tema, a fim de
aprofundarmos os conhecimentos dessa
realidade. Para isso, levantamos os
trabalhos de pesquisadores do Programa de
Pós-Graduação em Educação (PPGE) e do
Mestrado Profissional e Educação
(PPGMPE) da UFES. O primeiro foi
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
16
criado em 1978 e credenciado em
02/02/1999 (Portaria MEC nº182). Com
mais de 40 anos de existência, é o único
Programa de Pós-Graduação em Educação
da Universidade Federal do Espírito Santo
que oferta o curso de doutorado em
Educação. O segundo foi criado em 2019
sob o Parecer CNE/CES 182/2017.
Foram identificados, entre teses de
doutorado e dissertações de mestrado dos
últimos dez anos, 41 estudos sobre
temáticas que envolviam os descritores
“educação especial” e “inclusão”, e 23
sobre o descritor “educação do campo”. A
visita a esses trabalhos foi importante para
conhecer a realidade da inclusão de
estudantes com deficiência em diferentes
em contextos do Espírito Santo.
De todas as pesquisas, apenas uma,
envolvendo educação especial, foi
desenvolvida no contexto da escola do
campo. Intitulada “Realidades em contato:
construindo uma interface entre a educação
especial e a educação do campo”, pelo
autor Christiano Félix dos Anjos, a
pesquisa cartográfica analisou as conexões
entre Educação do Campo e Educação
Especial no âmbito do PPGE/UFES nos
anos de 2006 a 2014. Concluiu que a
invisibilização e os silenciamentos se dão
por meios que atuam a partir de uma
determinada realidade dominante, de forma
que a Educação Especial e a Educação do
Campo permanecem de certa forma
desvinculadas. Por isso o autor expõe a
necessidade de haver mais estudos sobre a
Educação Especial em escolas do campo
(Anjos, 2016).
Tem-se, portanto, uma lacuna de
estudos que precisa ser priorizada para que
a educação do campo seja inclusiva para
além do que executa em sua gênese com
pequenos agricultores, quilombolas, povos
indígenas, pescadores, assentados,
ribeirinhos, lavradores, sem-terra,
agregados, caboclos, meeiros, boia-fria. É
preciso pensar também no público com
deficiência que faz parte dessas populações
e que precisa do acesso integral à
educação.
Inclusão escolar de estudantes público-
alvo da educação especial na escola do
campo: o que dizem os professores?
Conforme citado anteriormente, as
perguntas do questionário visaram traçar
um perfil dos professores que atuavam nas
escolas A e B com relação a: tempo de
atuação na Educação, formação (inicial e
continuada), quantidade de escolas onde
atuavam e conhecimento a respeito da
Política Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva (2008).
Paralelo a isso, buscaram compreender
como eles analisavam a própria atuação em
sala de aula com os alunos da Educação
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
17
Especial e o que seria necessário, na visão
deles, para aprimorar essa inclusão.
Em relação ao tempo de atuação
como professores, em ambas as escolas,
60% atuavam na educação mais de dez
anos. No que se refere à formação desses
profissionais, os dados levantados apontam
que: a maioria declarou ser pós-graduada
(60% na escola A e 84% na escola B),
inclusive havendo professor com mestrado
(escola A). Ambas as escolas declararam
ter apenas 1 professor com ensino superior
incompleto, mas que estaria prestes a
concluir a licenciatura em Educação do
Campo. As demais graduações se
concentravam em outras licenciaturas
(Letras, Matemática, Geografia, Biologia)
ou Pedagogia.
Quanto à atuação desses
profissionais em outras escolas, as
realidades se mostraram mais distintas:
enquanto na escola a maioria (67%)
conciliava o trabalho com outras escolas,
na escola B poucos atuavam em outras
instituições (apenas 25%). Os professores
justificaram não trabalhar em outros locais
devido à distância de onde moravam.
Com relação ao conhecimento que os
professores tinham sobre a Política
Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva, apenas
7% da escola A disse não conhecer, um
índice menor que os 14% da escola B. Os
demais professores disseram conhecer bem
ou um pouco a PNEEPEI. Quanto a esse
tópico, estas foram algumas manifestações:
A proposta de assegurar a inclusão
escolar garantindo o acesso dos
alunos com necessidades especiais ao
ensino regular é boa, porém o que
falta é preparar os professores. Não é
somente dar o direito e por [os
alunos] no ensino regular, precisa
capacitar todos os profissionais
envolvidos nesse processo, dar
condições de trabalho (Professor A4).
A política Nacional é desencadeada
com direitos em prol dos estudantes.
E eu vejo essa política assegurando a
inclusão escolar de alunos com
deficiência, transtornos globais do
desenvolvimento e altas
habilidades/superdotação, orientando
os sistemas de ensino para garantir o
aprendizado e a frequência desses
estudantes na escola (Professor A12).
Sim. Até certo ponto, acho útil e
necessário, pois a inclusão é algo que
todos temos que aprender e aceitar
em nosso dia a dia, o problema que
acarreta é que muitas escolas da rede
municipal e estadual não tem o
profissional preparado para lidar com
esses estudantes, ou a escola não tem
estrutura adequada para tal (Professor
A13).
Em parte, não profundamente. Penso
que no que diz respeito à lei houve
grandes conquistas, entretanto na
prática, dentro das escolas, isso nem
sempre é garantido. Falta profissional
específico, materiais pedagógicos e
formação para toda comunidade
escolar (Professor B8).
Sim. Na teoria tudo é muito bom,
mas em compensação na prática tem
muitas falhas. Crianças que não têm
seu direito reservado, pais que não
conhecem os direitos ou que não
correm atrás de melhorias, dizendo
que o que tem está de bom agrado.
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
18
Professores que não estão aptos, pois
não passaram por uma formação na
área e escolas que acabam servindo
de depósitos, pois não sabem o que
fazer (Professor B11).
Um dos docentes acrescentou que a
inclusão é um “... movimento muito
importante, fundamentado na concepção de
direitos humanos, que conjuga igualdade e
diferença como valores indissociáveis”
(Professor B2).
Percebemos, pelos depoimentos, que
a maioria dos professores conhecia, mesmo
que superficialmente, a Política Nacional
de Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva (2008) e apontavam
para a falta de formação continuada dos
profissionais, bem como a precária
condição de trabalho quanto à estrutura
física e aos materiais pedagógicos.
No que diz respeito à frequência e à
participação dos professores em formação
na área da Educação Especial, os dados
revelaram que: na escola A, 87% diz ter
frequentado curso de formação na área da
Educação Inclusiva, enquanto na escola B,
esse número diminui para 58%, mesmo
assim foi correspondente a mais da metade
do corpo docente. Cabe ressaltar que, na
primeira, havia maior rotatividade de
profissionais, enquanto na segunda havia
um grupo fixo que atuava apenas nessa
escola por serem também moradores de
comunidades do entorno.
Quanto ao trabalho desses
professores em sala de aula regular com os
alunos público-alvo da educação especial,
eles manifestaram que:
Tabela 02 - Atuação dos professores com estudantes PAEE.
O que dizem os professores sobre a própria atuação com os
alunos PAEE?
Escola A
Escola B
Têm dificuldade em desenvolver atividades para esse público
40%
17%
Não desenvolvem atividades adaptadas às necessidades desses alunos
7%
25%
Procuram desenvolver atividades com adaptações
53%
58%
Fonte: pesquisa das autoras (2020).
Assim, apesar de os professores da
escola A terem frequentado em sua maioria
formação na área da Educação Especial,
esse foi o grupo que mais expressou
dificuldade (40%) quanto a desenvolver
atividades em suas aulas com adaptações
para alunos com deficiência; enquanto na
escola B, onde um número menor de
professores (57%) participou de formações
na área da Educação Especial, 17%
disseram ter dificuldade para desenvolver
atividades adaptadas. Por outro lado, nessa
mesma escola, 25% reconheceram que
sequer tentam fazê-lo. Assim, embora a
formação não seja suficiente para eliminar
as inseguranças dos professores quanto ao
atendimento a esses alunos, parece pelo
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
19
menos instigar o interesse por atendê-los
conforme as necessidades específicas.
Quanto a isso, os docentes
manifestaram como veem o próprio
trabalho: “Às vezes deixo a desejar. Porque
sinto muita dificuldade em preparar
alguma atividade diferenciada e que esteja
de acordo com o conteúdo que estou
trabalhando” (Professor A2). Outro
professor relatou que: Ele [o trabalho]
acontece levando em consideração o
comprometimento do aluno que é autista e
praticamente realiza atividades com
recortes, colagem; também é acompanhado
por uma estagiária que o auxilia nas
atividades” (Professor A5). Enquanto outro
docente ponderou: “... como não temos
muitos recursos e formações, fazemos o
que está ao nosso alcance, sendo que se
tivéssemos mais apoio e recursos poderia
ocorrer um trabalho melhor desenvolvido”
(Professor A6). Paralelo a isso, um dos
profissionais reconheceu: “Hoje eu não
faço nenhum planejamento específico para
os alunos especiais, porém auxilio de
forma diferenciada esses estudantes”
(Professor A8). O coro foi endossado pelo
professor B2: “Como os demais colegas da
escola, eu sempre fico a me questionar
qual caminho devo seguir para atender
melhor e com mais eficiência as
necessidades dessas crianças. Nem sempre
temos o material pedagógico e formação
necessária para atendê-los”. O que foi
reforçado pelo professor B8: “Como
muitos professores que conheço, faço
trabalhos de forma isolada, testando
atividades e materiais sem auxílio
necessário”.
É perceptível, mediante as
manifestações dos professores, que eles
sentem a necessidade de ter acesso à
formação continuada, não somente para os
profissionais de AEE, mas para todos os
envolvidos no processo de ensino e
aprendizagem desses estudantes. Além
disso, reclamam da falta de material
pedagógico para apoio.
Em diversas falas, os professores
relataram que, embora recebam suporte da
equipe pedagógica e da Secretaria de
Educação, eles se sentem frustrados por
não saberem lidar com determinadas
dificuldades encontradas diariamente.
Ao solicitar a opinião dos
professores sobre o que consideravam
necessário para melhorar a inclusão nas
escolas, estes foram alguns
pronunciamentos:
É preciso um maior envolvimento
dos professores de áreas específicas
(6º ao 9º). Os mesmos ainda
encontram dificuldades no
acolhimento desses estudantes em
sala de aula. As atividades precisam
ser adaptadas para os estudantes com
deficiência, mas para essas
adaptações é preciso pesquisas,
buscar orientações com o professor
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
20
de AEE e muitas vezes isso não
acontece (Professor S3).
A inclusão deve ser tratada como um
conjunto de profissionais para
orientar o aluno em seu
desenvolvimento cognitivo, motor e
afetivo. Vejo que, colocam na escola
um aluno e às vezes um
acompanhante e falam que isso é
inclusão. A inclusão vai além, precisa
de parceiros como: psicólogos,
médicos, fisioterapeutas, entre outros
(Professor B1).
É preciso mais investimento do
governo em materiais alternativos e
adaptados para a necessidade da
escola, oferecer cursos de
capacitação para os professores. A
família estar mais presente em
parceria com a escola dando
condições melhores aos estudantes
que necessitam da inclusão
(Professor B6).
Outro docente atentou para
necessidade de parcerias: “Precisa haver
parceria entre escola, família e
profissionais da saúde, pois muitas vezes
os professores buscam conhecimento e
desenvolvem suas práticas sem apoio
nenhum (Professor S11). Enquanto um
deles ressaltou: “Precisamos de mais
profissionais especializados em cada caso,
que os alunos recebam mais horas de
atendimento individualizado e que isso
aconteça em outro horário, não durante a
aula do ensino regular (Professor B4).
Houve, ainda, quem atentasse para a
necessidade de recursos e de formação:
“Vejo que os professores têm boa vontade.
O que falta é a viabilização de recursos,
profissionais e formação. A lei precisa
acontecer na prática (Professor B8).
Os depoimentos apontam que, para
os professores, a inclusão de alunos PAEE
precisa partir de uma ação coletiva entre
profissionais da educação e da saúde, além
da parceria com as famílias. Além disso, os
profissionais se contrapõem à ideia de que
providenciar um acompanhante para o
aluno com deficiência seja uma solução
para incluí-lo, pois, segundo os docentes,
muitos acompanhantes focam apenas na
socialização desses estudantes, seja pela
falta de experiência, falta de formação ou
pelo excesso de cuidados; com isso,
acabam privando essas crianças e
adolescentes de um trabalho pedagógico
direcionado às necessidades que a
deficiência impõe. Cabe ressaltar que a
socialização, por si só, não garante o
acesso do estudante à construção coletiva
de conhecimentos. São necessárias
providências que garantam as
acessibilidades comunicacional,
programática, instrumental, física e
tecnológica para que haja o pleno
envolvimento dele nas atividades da vida
escolar.
Os professores também reforçaram
em seus depoimentos a necessidade de
formação na área da Educação Especial, o
que poderia auxiliá-los a compreender as
dificuldades e as singularidades dos
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
21
estudantes, além de adaptar metodologias,
produzir materiais mais adequados a cada
necessidade.
Além disso, os docentes apontaram
para a necessidade de fazer cumprir as leis,
assim como ampliar os investimentos,
garantindo conforto e mobilidade no
ambiente escolar, além do material
didático que atenda os estudantes e
professores, salas adaptadas, mobiliário
para atender às necessidades especificas de
cada sujeito, e que garanta o bem-estar
desses estudantes no ambiente escolar.
Tudo isso aliado ao investimento em
pesquisas e em formações específicas para
todos os profissionais da área da educação
e não somente para os professores que
atuam em salas multifuncionais.
Percebe-se, assim, que os desafios
apontados pelos professores muito se
assemelham ao que relatam as pesquisas
realizadas em contextos urbanos, todavia
com especificidades que precisam ser
tensionadas no contexto da educação do
campo. Isso pode sinalizar a necessidade
de se pensar o atendimento educacional
especializado em moldes diferenciados das
escolas urbanas, considerando as questões
geográficas, realidades das famílias e
possibilidades gestoras. Nessa mesma
direção, a formação desses docentes na
área da educação especial também precisa
abarcar as especificidades do campo, sob o
risco de que o atendimento aos alunos da
educação especial seja sempre postergado
por não ser possível reproduzir nesse
contexto um modelo arquitetado para as
cidades, como é o caso do atendimento no
contraturno.
Considerações finais
Este estudo, desenvolvido em duas
escolas do campo do estado do Espírito
Santo, sinaliza que estas apresentam
complexidades semelhantes ao contexto
urbano quando se trata de garantir o
atendimento aos estudantes da educação
especial.
Os professores entrevistados
reivindicam formação continuada,
materiais didáticos acessíveis, trabalho
desenvolvido por equipe multidisciplinar,
atendimento educacional especializado no
contraturno, investimentos públicos, dentre
outras providências. Todavia, a realidade
do campo, em especial quanto às distâncias
que os estudantes percorrem de suas casas
até as escolas, conclama que soluções
sejam pensadas considerando esses
contextos locais. Quando isso não ocorre, o
atendimento deixa de se concretizar sob a
premissa de que não é possível reproduzir
nas realidades campesinas o mesmo
modelo praticado nas cidades, por
exemplo, quanto ao oferecimento do AEE
no contraturno.
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
22
Ora, sendo a história da inclusão de
pessoas com deficiência narrada
hegemonicamente sob o ponto de vista
urbano, faz-se necessário construir
caminhos para se garantir o atendimento
educacional especializado no campo, com
todas as providências previstas em
documentos oficiais, mas articulado às
realidades geográficas, culturais, sociais e
de interesse das comunidades. Uma vez
reconhecida a educação no/do campo, com
todas as suas especificidades, é preciso
pensar também na educação especial no/do
campo.
Quando os professores são
convocados a olhar para as próprias
práticas na inclusão de estudantes com
deficiência, paralelo às inquietações que
eles revelam, há propostas exequíveis,
como a formação continuada, a ampliação
dos investimentos para garantir
acessibilidade no ambiente físico e nos
materiais didáticos, a parceria com a área
de saúde, dentre outras.
A carência de formação acaba se
refletindo na falta de conhecimento
aprofundado sobre a Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva (2008) e também de
outras legislações. Assim, tem-se um hiato
quanto ao entendimento sobre quem seria o
público-alvo da educação especial, quais
seriam os direitos desses estudantes e qual
seria o papel do professor no trabalho
cotidiano com essas crianças e jovens, o
que pode acabar adiando o trabalho
pedagógico direcionado às necessidades e
potencialidades desses estudantes.
Concordando com Cury (2016), a
escolarização dos sujeitos não pode
permitir nenhuma forma de discriminação
por sexo, raça, etnia, religiosa e
capacidade, pois cada cidadão tem o direito
de estar nos mesmos estabelecimentos e
participar das atividades da maioria dos
estudantes da mesma idade, com os ajustes
necessários para o bem-estar e a
permanência desses sujeitos no ambiente
escolar. Isso fora garantido pela
Constituição Federal em 1988, quando no
Art. declara que “todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza”. Todavia, os depoimentos
denunciam que ainda lacunas que
causam morosidade nesse processo de
inclusão.
Para que esse tratamento igualitário
ocorra, é necessário fazer valer o que
consta na Política Nacional de Educação
Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva (2008, p. 13), que proclama:
Transversalidade da educação
especial desde a educação infantil até
a educação superior;
Atendimento educacional
especializado;
Continuidade da escolarização nos
níveis mais elevados do ensino;
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
23
Formação de professores para o
atendimento educacional
especializado e demais profissionais
da educação para a inclusão escolar;
Participação da família e da
comunidade;
Acessibilidade urbanística
arquitetônica, nos mobiliários e
equipamentos, nos transportes, na
comunicação e informação e
Articulação intersetorial na
implementação das políticas
públicas.
Feitas essas reflexões, por ora, esta
pesquisa busca somar-se aos poucos
estudos sobre a inclusão de estudantes com
deficiência em escolas do campo. Os dados
apresentados vislumbram que há itinerários
a serem trilhados no âmbito da educação
especial e inclusiva nesse contexto. Ainda
pouco se sabe sobre como a deficiência
impacta a vida dos sujeitos do campo,
quais as perspectivas desses sujeitos, como
são as relações familiares e como a
educação pode exercer sua práxis
transformadora também na vida dessas
pessoas sem precisar reproduzir modelos
pensados para outras realidades, mas
também sem suprimir os direitos
garantidos em lei. Este seria o prelúdio
para se pensar em uma educação especial
no/do campo? Talvez.
Referências
Anjos, C. Felix. (2016). Realidades em
Contato: Construindo uma Interface entre
a Educação especial e Educação do
Campo (Dissertação de Mestrado).
Universidade Federal do Espírito Santo,
Vitória.
Brandão, C. R. (2007). O que é educação.
São Paulo: Brasiliense.
Caldart, R. S. (2002). Por Uma Educação
do Campo: traços de uma identidade em
construção. In Kolling, E. J., Cerioli, P. R.,
& Caldart, R. S. (Orgs.). Educação do
Campo: identidade e políticas públicas
(pp. 18-25). Brasília, DF: articulação
nacional Por Uma Educação do Campo.
Caldart, R. S. (2012). Educação do Campo.
In Caldart, R. S., Pereira, I. B., Alentejano,
P., & Frigoto, G. (Orgs.). Dicionário da
Educação do Campo (pp. 257-265). Rio de
Janeiro, RJ: Escola Politécnica de Saúde
Joaquim Venâncio, Expressão Popular.
Cury, C. R. J. (2016). Educação Inclusiva
como direito. In Victor, S. L., & Oliveira,
I. M. (Orgs.). Educação Especial: políticas
e formação de professores (pp. 17-34).
Marília, SP: ABPEE.
Constituição da República Federativa do
Brasil. (1988, 05 de outubro). Recuperado
de: http://www.senado.gov.br/sf/legislacao
/const/
Freire, P. (2016). Pedagogia do oprimido.
Rio de Janeiro: Paz e Terra.
Gil, A. C. (2008). Como elaborar projetos
de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas.
Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
(1996, 23 de dezembro). Estabelece as
Diretrizes e Bases da Educação
Nacional. Recuperado
de: http://www.senado.gov.br/sf/legislacao
Decreto n. 7.352/2010. (2010, 4 de
novembro). Dispõe sobre a política de
educação do campo e o Programa Nacional
de Educação na Reforma Agrária
PRONERA. Recuperado de:
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020). Educação Especial em escolas do campo: um recorte sobre a inclusão
educacional no interior do Espírito Santo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e9068
10.20873/uft.rbec.e9068
2020
ISSN: 2525-4863
24
http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_
Ato2007-2010/2010/Decreto/D7352.htm
Minayo, M. C. S. (2002). Ciência Técnica
e Arte: O desafio da Pesquisa Social. In
Deslandes, S. F., Neto, O. C., Gomes, R.,
& Minayo, M. C. S. (Orgs.). Pesquisa
Social: teoria, método e criatividade.
Petrópolis, RJ: Vozes.
Política Nacional de Educação Especial
na Perspectiva da Educação Inclusiva
(2008). Recuperado de:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=
com_docman&view=download&alias=166
90-politica-nacional-de-educacao-especial-
na-perspectiva-da-educacao-inclusiva-
05122014&Itemid=30192
Informações do artigo / Article Information
Recebido em : 30/04/2020
Aprovado em: 19/05/2020
Publicado em: 03/07/2020
Received on April 30th, 2020
Accepted on May 19th, 2020
Published on July, 03rd, 2020
Contribuições no artigo: As autoras foram as
responsáveis por todas as etapas e resultados da
pesquisa, a saber: elaboração, análise e interpretação dos
dados; escrita e revisão do conteúdo do manuscrito
e; aprovação da versão final publicada.
Author Contributions: The author were responsible for
the designing, delineating, analyzing and interpreting the
data, production of the manuscript, critical revision of the
content and approval of the final version published.
Conflitos de interesse: As autoras declararam não haver
nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
Conflict of Interest: None reported.
Orcid
Andressa Dias Koehler
http://orcid.org/0000-0003-4934-777X
Taiane Christo Chaga
http://orcid.org/0000-0002-1860-7906
Lucimar Aparecida Stein Kuster
http://orcid.org/0000-0002-1030-5057
Como citar este artigo / How to cite this article
APA
Koehler, A. D., Chaga, T. C., & Kuster, L. A. S. (2020).
Educação Especial em escolas do campo: um recorte
sobre a inclusão educacional no interior do Espírito Santo.
Rev. Bras. Educ. Camp., 5, e9068.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e9068
ABNT
KOEHLER, A. D.; CHAGA, T. C.; KUSTER, L. A. S.
Educação Especial em escolas do campo: um recorte
sobre a inclusão educacional no interior do Espírito Santo.
Rev. Bras. Educ. Camp., Tocantinópolis, v. 5, e9068,
2020. http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e9068