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Revista Brasileira de Educação do Campo
Brazilian Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12824
Educação do campo no Ceará: uma análise do Projeto
Político Pedagógico da Escola do Campo Filha da Luta
Patativa do Assaré em Canindé
Aline Laureano Machado1, Milena Aires de Ávila2, Maria Aires de Lima3, Frederico Jorge Ferreira Costa4
1, 2, 3, 4 Universidade Estadual do Ceará - UECE. Programa de Pós-Graduação em Educação. Campus Itaperi. Avenida. Dr.
Silas Munguba, 1700, Itaperi. Fortaleza - CE. Brasil.
Autor para correspondência/Author for correspondence: alinemachado200@hotmail.com
RESUMO. Este artigo tem por objetivo geral compreender, por
meio da análise do Projeto Político Pedagógico (PPP) da Escola
do Campo Filha da Luta Patativa do Assaré, os pressupostos
teórico-metodológicos e as categorias basilares norteadoras da
Educação do Campo no Ceará: trabalho como princípio
educativo, educação politécnica e educação omnilateral.
Compreende-se que a Educação do Campo se constitui como
uma categoria que se opõe ao tipo de educação escolar que
reproduz as relações sociais contraditórias do modo de produção
capitalista. Diante disso, a escola do campo, para se contrapor às
relações sociais alienadas, poderá estar alicerçada num PPP que
se propõe a contribuir para a formação integral dos indivíduos
que compõem o espaço do campo brasileiro. Para a realização
desse trabalho, recorreu-se às contribuições de autores que são
referências na Educação do Campo, entre os quais podemos
citar: Frigotto (2012), Caldart (2012) e Ribeiro (2012). Diante
da análise do PPP, concluímos que os pressupostos presentes no
documento analisado se objetivam em uma educação que busca
a emancipação dos sujeitos do campo, a partir da valorização
dos movimentos sociais, das lutas sociais, dos conhecimentos
historicamente produzidos e de uma formação que abarque uma
concepção ampla e crítica da realidade vivida.
Palavras chaves: educação do campo, projeto político
pedagógico, escola do campo, Ceará.
Machado, A. L., Ávila, M. A., Lima, M. A., & Costa, F. J. F. (2022). Educação do campo no Ceará: uma análise do Projeto Político Pedagógico da Escola do
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Rural Education in Ceará: an analysis of the Political
Pedagogical Project of the Field School Daughter of the
Fight Patativa do Assaré in Canindé
ABSTRACT. This article aims to understand, through the
analysis of the Political Pedagogical Project (PPP) of the Field
School Daughter of Luta Patativa do Assaré, the theoretical-
methodological assumptions and the basic guiding categories of
Rural Education in Ceará: work as a principle education,
polytechnic education and omnilateral education. It is
understood that Rural Education is constituted as a category that
opposes the type of school education that reproduces the
contradictory social relations of the capitalist mode of
production. In view of this, the rural school, in order to oppose
alienated social relations, may be based on a PPP that proposes
to contribute to the integral formation of the individuals that
make up the space of the Brazilian countryside. To carry out this
work, we resorted to the contributions of authors who are
references in Rural Education, including: Frigotto (2012),
Caldart (2012) and Ribeiro (2012). In view of the analysis of the
PPP, we conclude that the presuppositions present in the
analyzed document are aimed at an education that seeks the
emancipation of rural subjects, based on an appreciation of
social movements, social struggles, historically produced
knowledge and a training that encompasses a broad and critical
conception of lived reality.
Keywords: rural education, political pedagogical project,
country school, Ceará.
Machado, A. L., Ávila, M. A., Lima, M. A., & Costa, F. J. F. (2022). Educação do campo no Ceará: uma análise do Projeto Político Pedagógico da Escola do
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Educación Rural en Ceará: un análisis del Proyecto
Político Pedagógico de la Escuela de Campo Hija de la
Lucha Patativa de el Assaré en Canindé
RESUMEN. Este artículo tiene como objetivo comprender, a
través del análisis del Proyecto Político Pedagógico (PPP) de la
Escuela de Campo Hija de la Lucha Patativa de el Assaré, los
supuestos teórico-metodológicos y las categorías rectoras
básicas de la Educación Rural en Ceará: el trabajo como
principio educativo, educación politécnica y educación
omnilateral. Se entiende que la Educación Rural se constituye
como una categoría que se opone al tipo de educación escolar
que reproduce las relaciones sociales contradictorias del modo
de producción capitalista. Ante esto, la escuela rural, para
oponerse a las relaciones sociales alienadas, puede basarse en un
PPP que se proponga contribuir a la formación integral de los
individuos que componen el espacio del campo brasileño. Para
llevar a cabo este trabajo, recurrimos a las aportaciones de
autores que son referentes en Educación Rural, entre ellos:
Frigotto (2012), Caldart (2012) y Ribeiro (2012). A la vista del
análisis del PPP, se concluye que los presupuestos presentes en
el documento analizado están orientados a una educación que
busque la emancipación de los sujetos rurales, a partir de una
apreciación de los movimientos sociales, las luchas sociales, los
saberes históricamente producidos y una formación que engloba
una concepción amplia y crítica de la realidad vivida.
Palabras clave: educación rural, proyecto político pedagógico,
escuela de campo, Ceará.
Machado, A. L., Ávila, M. A., Lima, M. A., & Costa, F. J. F. (2022). Educação do campo no Ceará: uma análise do Projeto Político Pedagógico da Escola do
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Introdução
A questão agrária no Brasil tem sido cada vez mais evidenciada devido a problemáticas
como: concentração de terras por meio de latifúndios, desemprego, grandes plantações a base
de monocultura que levam a degradação dos solos, alterações climáticas, uso excessivo de
agrotóxicos1, perda da biodiversidade, ausência de uma política de soberania nacional (tanto
por conta da dependência tecnológica, como pela entrega dos recursos naturais), além de
também conduzir a uma mudança de hábitos alimentares de toda a população levando a
problemas de saúde.
Trata-se, portanto, de um problema em cadeia, e a Educação do Campo pode se
apresentar como uma proposta de educação que se contrapõe aos problemas vivenciados no
campo, pois traz em seu âmago a crítica ao sistema atual e a esperança de que as novas
gerações de camponeses e camponesas sejam sujeitos ativos, conscientes e tenham
perspectiva de vida no campo.
Assim, a realidade que se estabelece hoje no meio rural brasileiro consolida o
pensamento hegemônico de que o espaço rural, a agricultura, a produção agrícola e as práticas
educativas devem estar voltadas à expansão do agronegócio. O campo, neste sentido, está
ligado a um espaço estritamente de produção de mercadorias, onde não há espaço para o
desenvolvimento da vida humana e a sustentabilidade ambiental está submissa a viabilidade
econômica, expressando, assim, um projeto de sociedade em que inúmeros seres humanos são
expropriados.
Deste modo, sendo a Educação do Campo uma concepção de educação que busca a
mudança de paradigmas e da estrutura da nossa sociedade, e sendo a forma de pensar e
construir o conhecimento científico e a educação escolar básica as ferramentas de
continuidade e fomentação da sociedade em que vivemos e que é regida pelo estado burguês,
inferimos que essa categoria estaria então a desafiar a hegemonia da ideologia burguesa.
Diante do exposto, buscaremos compreender, utilizando-se de uma análise documental
tendo como referencial teórico o materialismo histórico-dialético, os pressupostos teóricos
que estão inseridos no Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola do campo Filha da Luta
Patativa do Assaré. Para esta análise nos guiaremos por meio dos seguintes conceitos
apresentados por Marx, segundo Frigotto (2012), como relativos à formação, na esteira da
superação das relações capitalistas e de suas contradições, e que estão intrinsecamente
ligados: a) o trabalho como princípio educativo; b) educação politécnica; c) educação
omnilateral.
Machado, A. L., Ávila, M. A., Lima, M. A., & Costa, F. J. F. (2022). Educação do campo no Ceará: uma análise do Projeto Político Pedagógico da Escola do
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A realização dessa pesquisa teve como motivação os estudos realizados a respeito da
Educação do Campo e, mais especificamente, sobre as Escolas do Campo de ensino médio
localizadas em áreas de assentamento da reforma agrária no Ceará. Esses estudos preliminares
demonstraram a necessidade de compreender melhor os pressupostos teóricos que
fundamentam as ações pedagógicas, bem como a organização do trabalho pedagógico
realizado nesses espaços formativos. Ainda, compreende-se a importância de difundir as
práticas desenvolvidas por essas escolas do campo. O PPP, nesse sentido, se mostra como o
balizador das ações pedagógicas, portanto, é para onde direcionamos nosso primeiro olhar.
O presente artigo está dividido da seguinte forma: um primeiro tópico com questões
preliminares importantes a respeito da Educação do Campo, seus fundamentos históricos e
alguns pressupostos; um segundo tópico que trata de contextualizar as escolas do campo de
ensino médio em áreas de assentamento de Reforma Agrária no Ceará, trazendo alguns dados
importantes; o terceiro tópico que busca apresentar a metodologia desenvolvida para a
realização desse estudo; o quarto tópico, em que os resultados e discussões da análise do PPP
são apresentados e, por fim, as considerações finais.
Algumas considerações sobre os fundamentos históricos e teóricos da Educação do
Campo
De acordo com a Resolução n° 02 de 2008 do Conselho Nacional de Educação (Brasil,
2008), a Educação do Campo se compreende como “a Educação Básica em suas etapas da
Educação Infantil, do Ensino Fundamental, Ensino Médio Educação Profissional técnica de
nível médio integrado com o Ensino Médio destinado às populações rurais”, ou seja, a
proposta da Educação do Campo tem como objetivo o atendimento de todas as etapas e
modalidades de ensino que constituem a educação básica para todos os povos que estão
situados no campo.
Os sujeitos que a Educação do Campo atende, conforme explicita a Resolução n° 02 de
2008 no seu artigo 1°, são os seguintes: os “agricultores familiares, extrativistas, pescadores
artesanais, os povos ribeirinhos, os assentados e os acampados, os quilombolas, caiçaras,
indígenas e outros” (Brasil, 2008). Desse modo, a educação do campo procura atender todas
as especificidades educacionais dos povos do campo, procurando sempre relacionar os
conhecimentos científicos historicamente produzidos pela humanidade aos saberes desses
povos que são construídos nas suas relações de resistência e luta pela terra, que é o principal
meio de produção de vida dos povos referenciados no presente parágrafo.
Machado, A. L., Ávila, M. A., Lima, M. A., & Costa, F. J. F. (2022). Educação do campo no Ceará: uma análise do Projeto Político Pedagógico da Escola do
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Para Oliveira e Campos (2012) o termo “Educação do Campo” pode ser situado em um
determinado tempo histórico. Anteriormente não se denominava Educação do Campo, mas
Educação Básica do Campo. Contudo, no contexto de organização da I Conferência Nacional
Por uma Educação Básica do Campo que foi realizada em Luziânia, Goiás, entre os dias 27 a
30 de julho no ano de 1998, houve uma mudança nos termos utilizados. O termo Educação
Básica do Campo foi substituído pelo termo “Educação do Campo”. A decisão da mudança
foi confirmada nos debates da II Conferência Nacional realizada em julho de 2004 (Caldart,
2012) e se deu pela compreensão de que a educação do campo abarca os processos educativos
como um todo, tanto aqueles que acontecem na educação formal (representada pela educação
básica), como aqueles que ocorrem nas comunidades e nos movimentos sociais. Além disso, a
educação do campo está presente na educação básica e no ensino superior, tendo ainda a
formação de professores como uma de suas reivindicações.
No âmbito das discussões para a preparação do documento base da I Conferência
Nacional por uma Educação Básica do Campo que foi finalizado em maio de 1998, estão
contidos os argumentos que consolidam o batismo do termo “Educação do Campo”, que
representaria uma contraposição na forma e no conteúdo ao que no Brasil, em outras décadas
do século XX, denominava de Educação Rural. No que tange a Educação Rural, foi
instituída pelos organismos oficiais e teve como propósito a escolarização como instrumento
de adaptação do homem ao produtivismo e a idealização de um mundo do trabalho urbano,
tendo sido um elemento que contribuiu ideologicamente para provocar a saída dos sujeitos
do campo para se tornarem operários das cidades. A educação rural desempenha o papel de
inserir os sujeitos do campo na cultura capitalista urbana (Oliveira & Campos, 2012, p. 240).
Para Silvana (2003 apud Ribeiro, 2012) a educação rural permanece vinculada a uma
concepção preconceituosa de camponês, pois não leva em consideração os saberes que
decorrem do trabalho dos agricultores. Ribeiro (2012) enfatiza que as escolas rurais, em
destaque as escolas de nível médio, se detinham em apenas ensinar as técnicas e o manuseio
dos instrumentos agrícolas, além do relacionamento com o mercado no qual o camponês
necessitaria de vender a sua produção para conseguir mais produtos com intuito de fomentar
mais ainda a sua produção. Sobre essas ações que ocorriam na escola rural Ribeiro (2012)
destaca que são registros da história da educação rural.
Ainda sobre a educação rural, nesta concepção de educação vigorou uma corrente de
pensamento denominada de “ruralismo pedagógico”2. Essa corrente de pensamento defendia a
existência de um tipo de escola que preparasse os filhos dos agricultores para permanecerem
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no território rural. Em função disso, a escola rural deveria estar associada ao trabalho agrícola
e adequar-se às necessidades das populações rurais. No entanto, como afirma Ribeiro (2012,
p. 298), “essas concepções como outras carregadas de ‘boas intenções’ permaneceram apenas
no discurso”.
Diante do exposto, compreende-se que a educação rural é oposta à concepção de
educação do campo que surgiu com outras propostas de construção de uma escola que
atendesse aos interesses dos povos do campo e que visasse eliminar os traços de uma
formação escolar que procurava atender as necessidades de um determinado grupo político
hegemônico, isto é, utilizavam o espaço rural para atender as necessidades do capitalismo.
A constituição da educação do campo se deu historicamente a partir das lutas pela
transformação da realidade educacional nas áreas de Reforma Agrária, que tiveram como
principal protagonista o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), e evoluiu
para lutas mais abrangentes pela educação do conjunto dos trabalhadores do campo. Para a
consolidação da educação do campo como nova forma de pensar a educação dos povos do
campo, foi preciso articular experiências históricas de lutas e resistências, como as Escolas
Famílias Agrícolas (EFAs), o Movimento de Educação de Base (MEB), as organizações
indígenas e quilombolas, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), e de
organizações sindicais. As articulações desses segmentos são imprescindíveis para o
entendimento de que a questão da educação não se resolve sozinha e nem apenas se restringe
ao espaço local. Caldart destaca (2012) que os sujeitos trabalhadores do campo que lutam por
terra, trabalho e território são os mesmos que se organizam para lutar por educação.
Para Caldart (2012) a educação do campo não surge como uma teoria educacional, pois
suas primeiras questões se constituíram através da prática, e os seus desafios ainda se
consolidam como sendo práticos. Todavia, por se tratar de um tipo de educação que tem como
base as lutas contra hegemônicas, a educação do campo necessitou de um arcabouço teórico
cada vez mais consistente que proporcionasse uma análise rigorosa da realidade concreta em
seu movimento contínuo e contraditório. Desse modo, a educação do campo se sustenta como
uma concepção de educação fincada em uma perspectiva emancipatória, que se relaciona a
um projeto histórico, às lutas e a construção de uma sociedade sem exploração e mais
humana, voltada às necessidades dos homens e não do capital.
A educação do campo, tendo as lutas dos povos do campo pelo direito de existir e
trabalharem na terra como seu principal objetivo, além de se constituir como uma educação
voltada para a formação humana e integral, dialoga com uma tradição pedagógica crítica, que
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se relaciona com os objetivos políticos de emancipação humana e da igualdade social.
Segundo Caldart (2004) a educação do campo tem como base três referenciais teóricos
críticos que se apresentam em autores diversos, mas que os pensamentos desses autores
convergem para a mesma proposta de emancipação dos povos oprimidos da cidade e do
campo. Para a autora as três referências teóricas da educação do campo são Pedagogia
Socialista, Pedagogia do Oprimido e Pedagogia do Movimento:
A primeira delas é a tradição do pensamento pedagógico socialista, que pode nos ajudar a
pensar a relação entre educação e produção desde a realidade particular dos sujeitos do
campo; também nos traz dimensão pedagógica do trabalho é da organização coletiva, e a
reflexão sobre a dimensão da cultura no processo histórico. ... A segunda referência para esta
interlocução é a Pedagogia do Oprimido e toda a tradição da Educação Popular que incluem
o diálogo com as matrizes pedagógicas da opressão (a dimensão educativa da própria
condição de oprimido). ... A terceira referência pedagógica para a educação do campo vem
de uma reflexão teórica mais recente, que estamos chamando de Pedagogia do Movimento,
que também dialoga com as tradições anteriores, mas se reproduz desde as experiências
educativas dos próprios movimentos sociais, em especial dos movimentos sociais do campo
(Caldart, 2004, p. 14).
Nessa perspectiva, a educação do campo se constitui como uma proposta de educação
que tem as lutas de resistências dos povos do campo e dos oprimidos desse modelo de
sociedade capitalista como mote. É importante pontuar que a sociedade atual tem como
principais características a exclusão, a opressão, a negação do direito ao trabalhador, a
destruição do meio ambiente e dos direitos sociais básicos, o que fomenta cada vez mais um
processo de desumanização entre os homens. É pelo fim dessas mazelas sociais que a
Educação do Campo surge e se desenvolve, norteando-se como uma prática educativa
humanizadora com intuito de superar a nefasta realidade imposta aos trabalhadores do campo
e da cidade por meio do modo de produção capitalista.
A Escola do Campo Filha da Luta Patativa do Assaré em Canindé, Ceará
O Ensino Médio ganhou espaço nas discussões e lutas pela educação escolar nos
assentamentos de reforma agrária, principalmente com as jornadas e lutas do MST em 2007.
É nessa efervescência das lutas que o movimento conseguiu que o Estado do Ceará se
comprometesse a construir escolas de ensino médio nos assentamentos de reforma agrária.
Com essa conquista, o MST/CE, através do Setor de Educação, inicia os debates para
construção coletiva dos PPPs das escolas do campo de ensino médio. Em 2010, são
inauguradas quatro escolas do campo: A Escola Francisco de Araújo Barros, no
Machado, A. L., Ávila, M. A., Lima, M. A., & Costa, F. J. F. (2022). Educação do campo no Ceará: uma análise do Projeto Político Pedagógico da Escola do
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Assentamento Lagoa do Mineiro, em Itarema; a Escola João dos Santos Oliveira no
Assentamento 25 de maio, em Madalena; a Escola Florestan Fernandes no Assentamento
Santana, em Monsenhor Tabosa, e, a Escola Maria Nazaré de Sousa no Assentamento
Maceió, em Itapipoca.
No mesmo ano o governo do Estado do Ceará designou, na Secretaria de Educação do
Estado (Seduc), uma equipe para tratar das ações da política de Educação do Campo. Em
2011, após passar por uma reestruturação, criou-se a Coordenadoria de Desenvolvimento da
Escola e da Aprendizagem (Codea) que fazia parte do Setor de Diversidade e Inclusão
Educacional da Seduc. Após nova reestruturação, a então denominada Codea passa a
denominar-se Coordenadoria de Diversidade e Inclusão (Codin), e a equipe de Educação do
Campo passa a fazer parte da Célula de Educação do Campo, Indígena, Quilombola e para as
Relações Étnico-raciais (Ceciq). Estabelece-se assim uma parceria contínua do MST com a
equipe de Educação do Campo da Seduc.
Há hoje, no Ceará, dez escolas do campo de ensino médio em áreas de assentamento da
reforma agrária. São elas:
1. EEM Francisco de Araújo Barros, Assentamento Lagoa do Mineiro, em
Itarema;
2. EEM João dos Santos Oliveira (João Sem Terra), Assentamento 25 de Maio,
em Madalena;
3. EEM Florestan Fernandes, Assentamento Santana, em Monsenhor Tabosa;
4. EEM Maria Nazaré de Sousa (Nazaré Flor), Assentamento Maceió, em
Itapipoca;
5. EEM Padre José Augusto Régis Alves, Assentamento Pedra e Sal, em
Jaguaretama;
6. EEM Filha da Luta Patativa do Assaré, Assentamento Santana da Cal, em
Canindé;
7. EEM Fideles de Moura, Assentamento Bonfim Conceição, em Santana do
Acaraú;
8. EEM Francisca Pinto, Assentamento Antônio Conselheiro, em Ocara;
9. EEM Paulo Freire, Assentamento Salão, em Mombaça;
10. EEM Irmã Tereza Cristina, Assentamento Nova Canaã, em Quixeramobim. (Victor,
Lopes & Lima, 2020, p. 41).
Foco do estudo aqui apresentado, a Escola do Campo Filha da Luta Patativa do Assaré,
inaugurada em 2017, está localizada no Assentamento Santana da Cal, no distrito de Bonito, e
nasceu da luta pela terra no município de Canindé, no Ceará3. Essa luta data de muitos anos
antes do surgimento da escola, mais especificamente no ano de 1971 quando camponeses por
meio de organizações populares como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Sindicato dos
Trabalhadores Rurais (STR) e o MST, decidem se libertar das correntes opressoras e
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participam da primeira ocupação de terra. A partir daí, diversas outras ocupações vão
surgindo e atualmente existem cerca de 73 assentamentos no município (Projeto Político
Pedagógico da Escola do Campo Filha da Luta Patativa do Assaré, 2017).
Os camponeses organizados no MST, na perspectiva de que a Educação do Campo é um
direito que deve ser garantido pelo Estado, se unificaram na reivindicação da construção de
escolas do campo de ensino médio, em âmbito nacional, para áreas de assentamentos, a fim de
proporcionar a permanência dos jovens no campo, pois além da garantia da terra era
necessária uma educação voltada para a realidade do campo. A Escola Patativa do Assaré,
portanto, é uma dentre as escolas conquistadas.
Metodologia
Considera-se que para a elaboração de qualquer produção teórica o pesquisador precisa
seguir um planejamento rigoroso para a obtenção de informações necessárias que irão
responder os seus objetivos de pesquisa, visando sempre organizar melhor as suas ideias, bem
como desenvolver hipóteses para comprová-las ou descartá-las. Para desenvolver o presente
texto iniciamos um levantamento preliminar. Gil (2002, p. 61) destaca que esse levantamento
preliminar pode ser entendido como um “estudo exploratório”. Esse estudo exploratório teve
como objetivo identificar na literatura clássica e recente os pressupostos e fundamentos
orientadores da educação do campo no Brasil e no Ceará.
Ainda, o presente artigo se constitui em um tipo de pesquisa de caráter documental.
Conforme dizem Lakatos e Marconi (2003), o que caracteriza a pesquisa documental é que a
fonte de coleta de dados está restrita a documentos, escritos ou não, constituindo o que se
pode denominar de fontes primárias, como é o caso do PPP analisado aqui.
O domínio das discussões a respeito da Educação do Campo auxiliou na organização e
coleta dos dados oriundos da análise do PPP. Para essa coleta e análise utilizamos o processo
metodológico da análise de conteúdo de Bardin (2011), que propõe a divisão da análise em
três fases básicas: a pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados
obtidos e interpretação.
A pré-análise é a fase da organização propriamente dita. corresponde a um período de
intuições, mas tem por objetivo tornar operacionais e sistematizar as ideias, de maneira a
conduzir a um esquema preciso de desenvolvimento de operações sucessivas, no plano de
análise. A exploração do material se as diferentes operações da pré-análise forem
convincentemente concluídas, a fase da análise propriamente dita não é mais do que a
aplicação sistemática das decisões tomadas. Quer se trate de procedimentos aplicados
manualmente ou de operações efetuadas por computador ... o tratamento dos resultados
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obtidos e interpretação dos resultados brutos são tratados de maneira a serem significativos
(“falantes”) e válidos. Operações estatísticas simples ou mais complexas (análise fatorial)
permitem estabelecer quadro de resultados, diagramas, figuras e modelos os quais
condensam e põem em relevo as informações fornecidas pela análise (Bardin, 2011, p. 131,
grifos nossos).
Diante do exposto, o método de análise de conteúdo, conforme explicita Triviños (1987,
p. 80) apoiando-se nos pressupostos de Bardin (2011), é entendido como “um conjunto de
técnicas de análise das comunicações, visando procedimentos sistemáticos e objetivos de
descrição do conteúdo da mensagem, obter indicadores qualitativos ou não, que permitam a
inferências de conhecimentos...”. O método da análise de conteúdo se torna consistente nas
mensagens escritas, devido às mensagens escritas serem estáveis e se constituírem em um
material estável o qual o pesquisador pode retornar todas as vezes que sentir necessidade para
esclarecer as suas dúvidas.
Análise do PPP: as categorias trabalho, omnilateralidade e politecnia aplicadas a
educação do campo
Ao analisar o PPP, partimos do entendimento de que este traz consigo uma linguagem, e
que conforme defende Gramsci (1978, p. 13) “toda linguagem contém os elementos de uma
concepção de mundo e de uma cultura” e por isso mesmo expressa a “maior ou menor
complexidade da ... concepção de mundo” de um sujeito histórico. A partir dessa afirmação
de Gramsci, podemos ter uma definição de que os documentos legais, marcos, resoluções,
portarias, dentre outros, podem refletir de uma maneira geral a visão de mundo dos sujeitos
que os elaboram, e ou os direcionam para atender determinadas demandas.
A fim de compreendermos os pressupostos políticos e pedagógicos da escola, partimos
de uma análise documental de seu PPP com enfoque no seu referencial teórico. Na
perspectiva educativa da escola existem algumas matrizes pedagógicas fundamentais para a
formação humana, e que a constituem no sentido não só de dignificar o ser, mas fazê-lo ser de
si, um ser consciente, que são: a) o trabalho; b) a luta social; c) a cultura; d) a organização
coletiva; e) a história (Projeto Político Pedagógico da Escola do Campo Filha da Luta Patativa
do Assaré, 2017).
A escolha destas matrizes ocorre devido a uma concepção de que “a base da formação
humana está na produção material de sua existência, no trabalho, na cultura, na luta social”
(Projeto Político Pedagógico da Escola do Campo Filha da Luta Patativa do Assaré, 2017, p.
20), portanto dentre estas matrizes, pretendemos destacar as questões que se relacionam ao
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trabalho, a omnilateralidade e a politecnia, por serem categorias de extrema relevância no
âmbito da formação humana, tendo como referencial Karl Marx e seus intérpretes.
A questão do trabalho para o método desta pesquisa, assim como para a escola objeto de
análise, torna-se mais relevante por ter um sentido de atividade humana vital para a
reprodução da vida humana e “não estritamente como trabalho alienado constituído sob o
capitalismo” (Projeto Político Pedagógico da Escola do Campo Filha da Luta Patativa do
Assaré, 2017, p. 20). Nas exatas palavras postas no documento: “As pessoas se humanizam ou
se desumanizam, educam-se ou se deseducam, através do trabalho e das relações sociais que
estabelecem entre si no processo de produção material de sua existência.” A evidência da
importância desta categoria no PPP também fica explícita na contagem de vezes que a palavra
“trabalho” aparece ao longo de todo o documento, cujo total é de 82 (vale ressaltar que o
documento todo tem 50 páginas, portanto temos uma média de 1,64 aparições desta palavra
por página).
Reforçando a relevância desta categoria, Frigotto (2012, p. 275) compreende que o ser
humano, no processo de realização do seu trabalho, age não só transformando a natureza do
ambiente em que vive, como também a sua própria natureza. Manacorda (2010, p. 22) ressalta
esse pensamento ao afirmar que
O homem não nasce homem: isto o sabem hoje tanto a fisiologia quanto a psicologia. Grande
parte do que transforma o homem em homem forma-se durante a sua vida, ou melhor,
durante o seu longo treinamento por tornar-se ele mesmo, em que se acumulam sensações,
experiências e noções, formam-se habilidades, constroem-se estruturas biológicas – nervosas
e musculares – não dadas a priori pela natureza, mas fruto do exercício que se desenvolve
nas relações sociais, graças às quais o homem chega a executar atos, tanto “humanos” quanto
“não-naturais”, como o falar e o trabalhar segundo um plano e um objetivo.
Postas essas questões, na redação do PPP (2017, p. 20) no tópico “O trabalho como
matriz da formação humana” há uma argumentação da relação entre o trabalho como
princípio educativo e a educação politécnica. O texto desenvolve-se a partir do trabalho em
seu sentido mais amplo, e afirma que o trabalho “como princípio educativo não é uma
metodologia a ser incorporado pela escola, mas um processo ético-político de socialização
humana.”. Em seguida, há uma menção à educação politécnica ao afirmar que
A formação para o trabalho (ou formação do trabalhador) que queremos para todos os jovens
em todas as escolas é aquela que deve fazer parte da própria educação básica de perspectiva
integral e unitária, não se separando de uma formação geral sólida e ampla, que tem o
trabalho como princípio educativo e que se concentra na chamada educação tecnológica ou
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politécnica (Projeto Político Pedagógico da Escola do Campo Filha da Luta Patativa
do Assaré, 2017, p. 20, grifo nosso).
Segundo Frigotto (2012a, p. 275, grifo nosso) a educação politécnica está diretamente
relacionada com o desenvolvimento científico das bases dos conhecimentos historicamente
produzidos pela humanidade e que
se vinculam ao processo de produção e reprodução da vida humana pelo trabalho, na
perspectiva de abreviar o tempo gasto para responder às necessidades (essas sempre
históricas) inerentes ao fato de o homem fazer parte da natureza e de ampliar o tempo livre
(tempo de escolha, de fruição, de lúdico e de atividade humana criativa), no qual a
omnilateralidade pode efetivamente se desenvolver.
Essa concepção dada por Frigoto (2012a) sobre educação politécnica coincide com o
que está posto no PPP da escola, assim como também explicita a conexão dessa concepção de
educação com a categoria de omnilateralidade. Esta última apesar de não ser citada de forma
literal ao longo texto, há uma referência a ela no ponto que trata sobre “A cultura como matriz
da formação humana”, na qual considera que o “ser social, histórico e cultural, abriga em si
uma complexidade de dimensões física, afetiva, intelectual, moral, espiritual, que estão todas
interligadas” (Projeto Político Pedagógico da Escola do Campo Filha da Luta Patativa do
Assaré, 2017, p. 21).
A relação com o que foi colocado no PPP da escola com a omnilateralidade pode ser
compreendida a partir da definição dada por Frigotto (2012a, p. 267) quando o autor afirma
que omnilateral tem relação com uma concepção “de formação humana que busca levar em
conta todas as dimensões que constituem a especificidade do ser humano e as condições
objetivas e subjetivas reais para seu pleno desenvolvimento histórico”. Para o autor (2012a, p.
267), as dimensões que conformam a vida humana envolvem tanto a sua vida corpórea
material, como o seu “desenvolvimento intelectual, cultural, educacional, psicossocial,
afetivo, estético e lúdico”. (Frigotto, 2012a, p. 267).
Há outro trecho do PPP localizado no ponto que trata sobre os objetivos educacionais da
escola, que se refere a uma concepção de educação omnilateral sem necessariamente utilizar o
termo em questão. Este trecho retrata os seguintes objetivos:
Educação voltada para várias dimensões da pessoa humana assumindo um caráter de
unilateralidade do ser humano, de forma a integrar as diversas esferas da vida, seja ela
religiosa, político-ideológico, formação organizativa, formação moral, formação técnica-
profissional, formação cultural, formação afetiva etc.
...
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Garantir da qualidade da ação educativa, com vistas ao desenvolvimento integral do
educando e educanda, visando às diversas dimensões da pessoa tendo como base os
princípios da liberdade, solidariedade, companheirismo e humanização; (Projeto Político
Pedagógico da Escola do Campo Filha da Luta Patativa do Assaré, 2017, p. 40, grifos
nossos).
A partir da análise dos termos que aparecem de forma explícita no texto do PPP,
evidencia-se o uso de “dimensões” e “integrar” ou “desenvolvimento integral” como
elementos que conformam uma aproximação teórica deste documento produzido pela
comunidade educativa que integra a Escola do Campo Filha da Luta Patativa do Assaré com a
categoria de educação omnilateral.
No que se refere ao currículo da escola e que também se relaciona com o conceito de
educação politécnica, mesmo que não seja apontado literalmente neste trecho do texto, há
uma busca por um currículo que esteja na contramão do que as classes dominantes
idealizaram para a escola pública do Brasil, em que as relações de poder hegemônicas sejam
quebradas, o conhecimento não se torne um produto mercadológico e os educadores meros
reprodutores de um conhecimento descontextualizado da realidade vivida pelos educandos.
Portanto, segundo o PPP da Escola do Campo Filha da Luta Patativa do Assaré (2017, p. 26)
este currículo idealizado pela escola do campo “reforça a perspectiva de produzir, a partir do
conhecimento empírico e do saber local, um conhecimento científico que tenha significado
para os educandos”. E isso pode se materializar na escola principalmente por meio de algumas
estratégias pedagógicas que são apresentadas no decorrer do texto como o Inventário da
Realidade4 e os Componentes Curriculares Integradores5: Organização de Técnicas e
Trabalho Produtivo (OTTP), Projeto de Estudo e Pesquisa (PEP) e Práticas Sociais e
Comunitárias (PSC).
Além dessas estratégias, há também o Campo Experimental que é uma estratégia
pedagógica que, segundo a redação do PPP, ocorre como uma busca de
alinhamento/articulação entre a educação e a produção realizada pelo trabalho com o objetivo
de socializar conhecimentos, desenvolver tecnologias e fortalecer uma agricultura popular
camponesa, construindo os caminhos para uma reforma agrária popular.
As estratégias pedagógicas são parte da coluna que sustenta e materializa as concepções
da escola e seu método. Elas se constituem a partir da Pedagogia dos Complexos definida por
Pistrak (2000) e detalhada no PPP da escola, a partir das formas de organização do Plano de
Estudos, definidos pela integração entre o
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... trabalho, as bases das ciências e das artes, os métodos e os tempos de ensino específicos, a
auto-organização, a organização individual e coletiva dos estudantes, os aspectos da
realidade, os objetivos formativos e êxitos e as fontes educativas. A concepção de educação,
os objetivos da educação e o meio educativo/atualidade são os pilares da proposta curricular
por Complexos de Estudo. As matrizes pedagógicas servem como organizadoras do
ambiente educativo na escola, e o trabalho como princípio educativo é o elemento central
da concepção de educação que entra na orientação do Plano de Estudos (Projeto
Político Pedagógico da Escola do Campo Filha da Luta Patativa do Assaré, 2017, p.
28, grifos nossos).
Por fim, com base na análise documental realizada a partir do PPP da Escola do
Campo Filha da Luta Patativa do Assaré, percebemos assim como na análise realizada por
Nascimento, Matias e Teixeira (2020) que os fundamentos teóricos, que basearam a
elaboração deste documento são um conjunto de teorias que buscam a promoção da
materialização de uma educação que seja própria do povo camponês e com o objetivo de
alcançar sua emancipação plena. Para sustentação deste objetivo é que foram apresentadas as
categorias que buscamos elucidar ao longo deste trabalho: o trabalho como princípio
educativo, a educação politécnica e a educação omnilateral.
Considerações finais
Esse artigo teve como objetivo analisar, a partir do PPP da Escola do Campo Filha da
Luta Patativa do Assaré, localizada no município de Canindé no Ceará, as categorias trabalho
como princípio educativo, a educação politécnica e a educação omnilateral, tendo como
pressuposto que a Educação do Campo se ergue a partir de uma concepção de educação
emancipadora. Para isso, foi realizada uma análise minuciosa do conteúdo do PPP, tendo
como horizonte que o texto do documento expressa as concepções daqueles que o
construíram.
A partir da realização desse trabalho foi possível concluir que o trabalho entendido
como essa atividade que se efetiva através da mediação teleológica orientada com o intuito de
transformar a natureza em valores de uso para a satisfação das necessidades históricas dos
homens, se caracteriza como uma atividade única e exclusiva do mundo dos homens, pois
somente os homens têm a capacidade de antecipar, projetar as suas ações na consciência antes
de as transformarem em objetivações. A atividade do trabalho é, pois, a relação insuperável
dos homens com a natureza. Conforme apresenta Marx (2011, p. 167), o trabalho é “assim,
uma condição de existência dos homens, independente de todas as formas sociais, eterna
necessidade natural de mediação do metabolismo entre homens e natureza e, portanto, da vida
humana”.
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A recuperação do sentido ontológico de trabalho tem uma contribuição grandiosa para a
efetivação da Educação do Campo, dado que é um modelo de educação que nasce da luta dos
trabalhadores e que busca eliminar as cercas do latifúndio, da ignorância e do capital. Nesse
sentido, a luta pela terra articula-se com a luta pela educação e contra o modelo capitalista de
exploração da natureza e dos homens.
Diante das injustiças e das desigualdades seculares que existem no campo brasileiro, as
lutas dos povos campesinos pelo direito a terra para produção de sua existência se tornam um
dos referenciais para a construção da Educação do Campo. Esse modelo de educação se
propõe a promover uma formação integral, omnilateral dos povos do campo, ou seja, uma
educação que potencialize as capacidades humanas de forma plena, em todas as suas
dimensões, e não fragmentada como ocorre nas propostas educativas hegemônicas que se
pautam em apenas fornecer mão de obra para o capital.
Dessa forma, consideramos que o PPP da Escola do Campo Filha da Luta Patativa do
Assaré pauta-se em toda a historicidade das lutas travadas pelos povos do campo pelo direito
de acesso à terra e, consequentemente, à educação. Também considera que os conhecimentos
produzidos nas lutas e movimentos sociais em conjunto com os conhecimentos científicos
produzidos historicamente devem ser incorporados no currículo escolar para que as atividades
propostas na escola tenham significados para os educandos, contribuindo assim para uma
nova realidade no campo, sem exploração do trabalho dos povos campesinos.
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Notas de fim
¹ Segundo a reportagem de título Número de agrotóxicos registrados em 2020 é o mais alto da série histórica;
maioria é genérico, diz governo (2021) no ano de 2020 foram aprovados um total de 493 agrotóxicos, o maior
número já registrado, equivalente a 4% a mais do que foi aprovado em 2019.
² De acordo com Prado (1995, p. 5) “o estudo do pensamento educacional no Estado Novo (1937- 1945)
encontra preciosas fontes nas ideias do ruralismo pedagógico.”. Destaca que essa concepção de educação rural
foi pensada por intelectuais que defendem “uma escola ... referida aos interesses e necessidades hegemônicas”.
³ Município localizado na macrorregião sertões de Canindé, a 120 km da capital, possui uma área de 3.032,390
km², com a população de 77.244 habitantes (IBGE, 2020).
4 Síntese de dados reunidos por toda a comunidade escolar (educadores, educandos, gestão, servidores e famílias
destes sujeitos) a fim de organizar todas as informações referentes às questões sociais, econômicas, políticas,
geográficas e organizacionais desta.
5 Segundo o PPP (2017, p. 30) estes “deverão funcionar como elos integradores entre as áreas do conhecimento
escolar e a realidade concreta, através da pesquisa, do trabalho produtivo e da intervenção social.”
Informações do Artigo / Article Information
Recebido em: 04/08/2021
Aprovado em: 13/04/2022
Publicado em: 06/07/2022
Received on August 04th, 2021
Accepted on April 13th, 2022
Published on July, 06th, 2022
Contribuições no Artigo: Os(as) autores(as) foram os(as) responsáveis por todas as etapas e resultados da pesquisa, a
saber: elaboração, análise e interpretação dos dados; escrita e revisão do conteúdo do manuscrito e; aprovação da versão
final publicada.
Author Contributions: The author were responsible for the designing, delineating, analyzing and interpreting the data,
production of the manuscript, critical revision of the content and approval of the final version published.
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ABNT
MACHADO, A. L.; ÁVILA, M. A.; LIMA, M. A.; COSTA, F. J. F. Educação do campo no Ceará: uma análise do Projeto Político
Pedagógico da Escola do Campo Filha da Luta Patativa do Assaré em Canindé. Rev. Bras. Educ. Camp., Tocantinópolis, v.
7, e12824, 2022. http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12824
