Journal of Biotechnology and Biodiversity | v.7 | n.3 | 2019

Journal of Biotechnology and Biodiversity
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Balanço energético da produção de etanol a partir da cana-de açúcar e as- pectos da produção brasileira atual
Romário Victor Pacheco Anteroa, Damina Beatriz da Silvaa*, Sarah Silva Bruma, Ailton Teixeira do Vale a
a Unidersidade de Brasília (UNB), Brasil
* Autor correspondente (damisb@uft.edu.br )
I N F O A B S T R A C T
Keyworks
ethanol biofuel
energetic balance sugarcane
Energy balance of ethanol production from sugarcane and aspects of current Brazilian production Interest in alternative energy sources has increased in recent times, especially those considered essential for the mitigation of greenhouse gas emissions. In this regard, biofuel production has been prominent worldwide, with ethanol being one of the main energy alternatives for the future. However, similar to what happens with every energy resource, ethanol also demands energy for its production. Thus, the ob- jective of this work was to analyze the energy balance of ethanol production from sugarcane, considering the energy-consuming activities. Also presented are the main characteristics related to ethanol production, the worldwide production cycle, the main producers, data on the current Brazilian sugarcane and ethano l productivity (2017/2018 crop), world ethanol production and the main destinations of Brazilian ethanol production. To this end, different articles and scientific papers published at the national and international level on the subject under discussion were consulted, through a study design carried out through qualita- tive and quantitative analysis of materials obtained in a literature review.
R E S U M O
Palavras- chaves
etanol biocombustível balanço energético
cana de açúcar
Nos últimos tempos têm crescido o interesse em fontes alternativas de energia, principalmente aquelas apontadas como essenciais para a mitigação das emissões de gases responsável pela problemática do efeito estufa. Nesse aspecto, a produção de biocombustíveis tem se destacado em todo o mundo, sendo o etanol apontado como uma das principais alternativas energéticas para o futuro. No entanto, semelhante ao que ocorre com todo recurso energético, o etanol também demanda energia para a sua produção. Dessa forma, o objetivo deste trabalho foi analisar o balanço energético da produção de etanol de primeira geração a partir da cana-de-açúcar, considerando as atividades consumidoras de energia. Também são apresentadas as principais características relacionadas à produção do etanol de primeira geração, o ciclo produtivo em escala mundial, os principais produtores, dados sobre a produtividade brasileira atual de cana-de- açúcar e etanol (safra 2017/2018), a produção mundial de etanol e os principais destinos da produção brasileira de etanol. Para isso, foram consultados diferentes artigos e trabalhos científicos publicados a nível nacio- nal e internacional sobre o tema em debate, através de um delineamento de estudos realizados por meio de análises qualitativas e quantitativas de materiais obtidos em revisão bibliográfica.
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INTRODUÇÃO
A sustentabilidade ambiental é um conceito que ganhou ênfase na última década devido às constan- tes preocupações sobre o uso massivo de combustí- veis fósseis e seus possíveis efeitos sobre as mu- danças climáticas. Sob esse ponto de vista, em 2016 as Nações Unidas lançaram a Agenda para o De- senvolvimento Sustentável 2030, a qual visa orien- tar e estimular ações voltadas ao aumento substan- cial da quantidade de produção de energia a partir de fontes renováveis (Unit Station, 2015). Nesse contexto, o aumento da produção de energia a partir de fontes renováveis deve se tornar um marco para todos os países (Handler et al., 2016), influenciando o financiamento de pesquisas que visem o aumento do desenvolvimento de produtos a partir de fontes renováveis.
Do total da demanda global de energia, 40% são consumidos sob a forma de combustíveis líquidos (Nanda et al., 2015), e espera-se que os veículos elétricos representem um quarto dos carros até 2040, diminuindo quase 13 milhões de barris (2.067 milhões de litros) por dia de petróleo bruto (BNEF, 2016). Nesse aspecto, os biocombustíveis assumem papel essencial, sendo o etanol a alterna- tiva predominante (Handler et al., 2016). Nesse ce- nário de empoderamento dos biocombustíveis e do uso de fontes renováveis de energia, o Brasil des- taca-se por possuir 39% de sua matriz energética composta por combustíveis renováveis (EPE, 2017). Dentre esses destaca-se o etanol produzido a partir da cana de açúcar, com o estabelecido pro- cesso de produção de primeira geração em larga es- cala (Moraes; Zaiat e Bonomi, 2015). Toda essa produtividade começou a se desenvolver no decor- rer da década de 1970 como resultado da crise pe- trolífera (Coelho et al., 2006) e tornou a utilização do etanol ao longo de décadas uma das principais fontes energéticas para o futuro (Oliveira; Serra e Oliveira, 2014).
No Brasil, o etanol de cana-de-açúcar tem pro- movido o desenvolvimento rural, a diversificação das fontes de energia, menor dependência das im- portações de petróleo e redução de gases de efeito estufa (GEE) (Coelho et al., 2006). Embora a pro- dução de etanol tenha crescido e se adequado como uma fonte promissora de combustível, sua produ- ção demanda energia em todo o ciclo produtivo. Dessa forma, para se adequar como uma fonte al- ternativa e viável economicamente, é necessário que, durante a produtividade, a energia gasta no processo seja compensada ao final das operações. Assim, para se ter noção da viabilidade do processo e eficiência do ponto de vista energético é necessá- rio realizar seu balanço energético.
O balanço energético compreende a relação en- tre a energia investida na produção de determinado produto (input) e a energia obtida na sua combus- tão, quando se referindo à produção de combustí- veis e biocombustíveis (Chechetto e Siqueira; Gamero, 2010; Gazzoni et al., 2009; Urquiaga e Boodey, 2005). Trata-se de um parâmetro que veri- fica a quantidade de energia fóssil investida e a energia obtida por durante a produção do combus- tível. Numericamente, seu valor é dado pela relação entre a energia obtida com o combustível e a ener- gia despendida durante a produção. Valores acima de 1 traduzem que a energia obtida é maior que a energia gasta, assim, o balanço é positivo e a fonte viável. Valores inferiores a 1 revelam um gasto maior na produção do combustível do que o obt ido durante a sua utilização, referindo-se dessa forma, a um balanço energético negativo (Oliveira; Serra e Oliveira, 2014).
Segundo Gazzoni et al., (2009), o balanço ener- gético pode ainda ser considerado uma importante ferramenta a partir do qual é possível aperfeiçoar a utilização de insumos para determinado cultivo e os parâmetros necessários para a eficiência produtiva de diversos sistemas, constituindo-se em uma im- portante ferramenta de análises econômicas. Por- tanto, é possível considerar o balanço ene rgético como um mecanismo essencial para determinar os pontos de gasto energético, fundamentando-se na busca por tecnologias poupadoras de energia (Cam- pos e Campos, 2004). De maneira geral, para ava- liar os méritos da substituição da gasolina pelo eta- nol, uma análise do equilíbrio energético e das emissões evitadas de gases de efeito estufa (GEE) deve ser realizada com a análise do ciclo de vida. As diferentes matérias-primas para a produção de etanol também devem ser comparadas em tais ter- mos, bem como a eficiência do uso da terra (Gol- demberg; Coelho e Guardabassi, 2008; Larson, 2006).
Diante do exposto, a partir de um minucioso le- vantamento em diferentes fontes na literatura, o presente trabalho descreve os principais fatores re- lacionados ao balanço energético do etanol, consi- derando os gastos energéticos para o cultivo da planta, transporte e para o processo produtivo. Além de abordar e discutir os principais parâmetros envolvidos no balanço energético da produção do etanol de primeira geração, o artigo também apre- senta os dados da produtividade brasileira de etanol na safra 2017/2018. Inicialmente são apresenta- se uma rápida abordagem sobre a produção de etanol a partir de diferentes precursores e as metodologias de obtenção disponíveis. Seguidamente é abor dada a produção brasileira atual de cana de açúcar, as es- timativas observadas por região e a produtividade
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brasileira de etanol em comparação com outros pa- íses. Finalizando, apresenta-se uma revisão abran- gente e comparativa entre diversos cálculos para o balanço energético verificados na literatura.
ABORDAGEM E METODOLOGIA
A metodologia aplicada considerou as informa- ções sobre os atuais métodos para produção de eta- nol de primeira geração a partir da comparação da produção de etanol de cana-de-açúcar no Brasil e demais culturas mundiais, com base na produtivi- dade média. Os dados apresentados foram obtidos a partir de uma extensa revisão bibliográfica utili- zando-se as palavras chaves “etanol, balanço ener- gético, cana de açúcar e biocombustíveis”. No ba- lanço energético da produção e uso de etanol, des- tacou-se as principais atividades envolvidas no pro- cesso, bem como os gases de efeito estufa (GEE) e o ciclo de vida da produção.
PRODUÇÃO DE ETANOL DE PRIMEIRA GERAÇÃO
Diversas matérias primas podem ser utilizadas

na produção de etanol, as quais podem ser divididas em três categorias: sacaríneas, amiláceas e celuló- sicas. Na primeira classe estão envolvidas as fontes
que possuem o açúcar sacarose (cana-de- açúcar, sorgo sacarino, beterraba, entre outros). No se- gundo grupo (amiláceos) têm-se os produtos com- postos por amido (mandioca, cereais, sorgo, batata, etc.). Em última categoria têm-se as matérias pri- mas celulósicas, na qual o etanol é produzido a par- tir da celulose existente em sua composição, desta- cando-se o eucalipto, bagaço de cana, casca de ar- roz, entre outros (Oliveira; Serra e Oliveira, 2014), o chamado etanol de segunda geração. De maneira geral a grande maioria do etanol produzido no
mundo é de cana-de-açúcar, principalmente no Bra- sil e milho nos Estados Unidos (que em conjunto representam 35,4 milhões de metros cúbicos, cerca de 72% da produção mundial) (Goldemberg; Coe- lho e Guardabassi, 2008). Devido à sua composi- ção, a cana de açúcar se destaca como uma das prin- cipais biomassas para aplicações com fins energé- ticos, principalmente no Brasil, como é abordado nos tópicos seguintes. A cultura se destaca entre as demais empregadas na produção do etanol por apresentar o maior rendimento da produção por unidade de área cultivada como se observa na fi- gura .1.
Figura 1 - Produtividade média do etanol por área para diferentes culturas (Oliveira, 2010) .
Dentre as formas de obtenção de etanol, a utili- zação da biomassa açucarada (cana e beterraba) possui duas etapas a menos que as outras formas, sendo excluída a fase de hidrolise ácida ou enzimá- tica (figura 2), o que torna o balanço energético para esse tipo de produção melhor que as demais. No entanto, diversos outros fatores devem ser con-
siderados em cada sistema de produção energética para se estimar o real balanço energético do ciclo produtivo do etanol.

Figura 2 - Fluxograma para a produção de açúcar e etanol a partir da cana. Adaptado de BNDS (2008).
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A partir do fluxograma ilustrado na figura 2, ob-
serva-se que inicialmente a cana é lavada e trans- portada para o sistema de preparo e extração do caldo, que contém a sacarose, sendo post eriormente separado da fibra (bagaço), o qual segue para a planta da usina e é empregado como combustível. O caldo obtido passa por uma série de processos, tais como calagem, aquecimento e decantação. Pos- teriormente é evaporado para ajuste da concentra- ção de açúcares e, eventualmente misturado com o melaço, originando o mosto. Este seguirá para as dornas de fermentação, onde será misturado com leveduras e fermentado por um período de 8 a 12 horas, dando origem ao vinho, com concentração de 7% a 10% de álcool. Ao final do processo as le- veduras são recuperadas mediante centrifugação e se inicia o processo de destilação, na qual o etanol é recuperado na forma hidratada, com aproximada- mente 96º GL. Nesse processo obtém-se também a vinhaça ou vinhoto residual, geralmente numa pro- porção de 10 a 13 litros por litro de etanol hidratado (Oliveira, 2010).
Produtividade brasileira atual de cana de açú- car
Nos últimos anos a cana-de-açúcar vem sendo considerada uma das maiores apostas para o setor de biocombustíveis devido à sua versatilidade para produção de produtos concomitante ao etanol. Além da produção do biocombustível e açúcar, as unidades produtoras têm se concentrado na busca de maior eficiência e sustentabilidade dos proces- sos, focando também na geração de energia elé- trica, o que vem auxiliando na redução dos custos e contribuindo para a sustentabilidade da atividade (CONAB, 2017). Nesse cenário, o mercado para a cana-de-açúcar está sustentado principalmente na produção de açúcar e etanol, caracterizado como setor sucroenergético, do qual 47% da cana plan- tada é destinada à produção de açúcar e 53% é des- tinada à produção de etanol, conforme se observa no fluxograma da figura 3 (CONAB, 2016; DE- PEC, 2017).

Fonte: Adaptado (CONAB, 2016; DEPEC, 2017).
Figura 3 - Fluxograma detalhado para o mercado consumidor de cana-de-açúcar e respectivos mercados de destinação.
Nas últimas décadas observou-se um cresci- mento constante do setor sucroenergético e, quadro após a os baixos valores observados em 2011/2012. Nesse contexto, estimativas apontam um aumento na produção de cana-de-açúcar de 55% entre 2010/2011 a 2022/2023, com expansão de área to- tal de 43%, ou 3,95 milhões de hectares (FI- ESP/ICONE, 2012). Em uma estatística mundial, o Brasil é apontado como o maior produtor de cana - de-açúcar e dados recentes para a safra 2017/2018 demonstram uma produtividade estimada para a temporada de 73.728 kg/ha. O aumento observado
em relação à safra anterior – aproximadamente 1,5%- é resultado do aumento da produtividade de- monstrado pelas lavouras da região Norte- Nordeste (7,5%) e, em menor escala, na região Centro- Sul, principal produtora nacional (1,3%), comparado com os valores observados na safra passada figura 5). Esses efeitos produtivos estão relacionados às condições climáticas que se mostraram favoráveis a partir de outubro de 2016, favorecendo o desen- volvimento das lavouras e o investimento tecnoló- gico das unidades com o uso de variedades genéti- cas mais produtivas e melhores tratos culturais.
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Figura 4 - Estimativa de produtividade de cana-de-açúcar por região. Dados de estimativa: agosto de 2017 (CONAB, 2016)

.
Tratando-se da produtividade, os dados do CO- NAB (CONAB, 2016) também apontam que esti- mativa de produção de cana-de-açúcar, na safra 2017/18, apresentou um decréscimo de 1,7%, em relação à safra anterior. Isso equivale a uma produ- ção de 646,34 milhões de toneladas de cana-de- açú- car, ante aos 657,18 milhões da safra 2016/17. Mesmo com a expectativa de melhoria da produti- vidade, a na redução de área, observada nos princi- pais estados produtores da Região Centro-Sul, será responsável pela expectativa de menor pr odução, quando se compara com o período anterior. Esses dados se mostram em desacordo com estimativas levantadas pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo no compendio Outlook Brasil 2022 - Projeções para o agronegócio, no qual é apontado um aumento de 1,3% ao ano na média brasileira da área destinada à produtividade de cana-de- açúcar (FIESP/ICONE, 2012).
Produtividade Brasileira Atual de Etanol
O Brasil se destaca atualmente como referência mundial em tecnologia sucroalcooleira, sendo atu- almente o segundo maior produtor mundial de eta- nol (superado em 2006 pelos EUA) e o único país onde os biocombustíveis são estritamente competi- tivos com derivados do petróleo. Dados elaborados e disponibilizados em 2017 pelo Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos (DEPEC) (DE- PEC, 2017), por exemplo, apontaram o país como responsável por aproximadamente 27,7% do etanol produzido mundialmente, estando atrás somente dos EUA que eram responsáveis por aproximada- mente 56,8% da produção mundial, como se veri- fica na figura 5 .

Figura 5 - Produção mundial de etanol (DEPEC, 2016).
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Parte da produtividade brasileira de etanol é des- tinada à exportação. O mercado, juntamente com o de açúcar, movimenta atualmente cerca de 5,7% das exportações. Do contingente de etanol comer- cializado internacionalmente, os EUA obtêm a maior parte, como se observa na Fig. 6. O país im- porta etanol brasileiro e comercializa via países do Caribe, como El Salvador, Jamaica e Costa Rica. Durante a safra 2014/15 a produtividade brasileira de etanol consolidou-se em 28,66 bilhões de litros.
Para a safra 2015/2016 houve um aumento de 156,94 milhões de litros, ou 0,5%. O etanol anidro (empregado na mistura com a gasolina) aumento de 355,17 milhões de litros, chegando a 12,08 bilhões, 350 milhões de litros a mais que a safra anterior. Para o etanol hidratado (empregado nos veículos flex fuel) as estimativas foram negativas, com uma redução de 1,2% em relação à safra passada ( CO- NAB, 2015).
Figura 6 - Países de destino das exportações brasileiras de etanol. Fonte: DEPEC (2015).

Comparada com as safras 2015/2016 e 2016 - 2017, a produção brasileira de etanol total no se- gundo levantamento da safra 2017/18 foi inferior. Nesse contexto, observou-se uma produtividade em litros de aproximadamente 26,12 bilhões, inferior em 6,1% às safras anteriores, que superaram 27,81 bilhões de litros. Esse decréscimo apresentou rela- ção direta com o aumento observado no consumo da gasolina em 2016, respaldando os preços do eta- nol anidro nas misturas de combustível, além dos preços favoráveis do açúcar que incentivaram a produção desta commodity em detrimento ao eta- nol. Neste sentido, a produção do etanol anidro na safra 2017-2018, contemplou um aumento de 0,2% em relação à safra passada, saindo de 11,07 bilhões de litros para 11,09 bilhões de litros (CON AB, 2016).
As estimativas negativas no avanço da produção brasileira de etanol, bem como a regressão da pro- dutividade no ano de 2016 também foram reporta- das em dados publicados pela Renewable Fuels As- sociation no compendio intitulado “ Building Prtnerships- Growing markets 2017 ethanol indus- try outlook”. Durante esse período, o Canadá e o Brasil permaneceram como os principais exporta-
dores da indústria de etanol americana, os quais re- ceberam aproximadamente metade da produção americana (RFA, 2017). As exportações para o Brasil aumentaram em decorrência dos preços rela- tivamente altos do açúcar, tornando-se necessário o aumento da produtividade para suprir a demanda doméstica. Na safra 2017-2018 observou-se uma produtividade de 26,12 bilhões de litros, redução de apenas 6,1% em razão da preferência pela produção de açúcar. Já para a produção de etanol anidro, em- pregado na mistura com a gasolina, ocorreu um au- mento de 0,2%, alcançando 11,1 bilhões de litros, influenciada pela manutenção do consumo de gaso- lina em detrimento ao etanol hidratado (CONAB, 2016).
Considerando a enorme produtividade brasileira de cana-de-açúcar e mais precisamente para a pro- dução de etanol que consome mais de 50% da pro- dução, a realização do balanço energético visando estabelecer os fluxos de energia, identificando a de- manda total e eficiência é importante ferramenta para aprimoramento das técnicas e busca por meto- dologias inovadoras na cadeia produtiva, de ma- neira a poupar e até substituir o uso de fontes de energia não renováveis. Dessa forma, para garantir a sustentabilidade dos biocombustíveis é necessário
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confirmar que os gastos exigidos para a produtivi- dade do etanol sejam compensados pelas atividades desenvolvidas com o produto final, considerando nesse aspecto, por exemplo, que a que a energia produzida a partir do etanol seja maior que a ener- gia consumida em sua produção.
Balanço energético da produção e uso de etanol
Para a realização do cálculo do balanço energé- tico, inicialmente, é necessário levantar todos os parâmetros relacionados desde o cultivo até o pro- cessamento final do biocombustível (Oliveira, 2010). Nesse aspecto, Oliveira; Serra e Oliveira (2014) também levam em consideração as chama- das atividades consumidoras de energia, segundo os quais, são fatores primordiais para a realização dos cálculos envolvidos na produção do etanol.
Além desses fatores, o balanço energético também deve considerar emissões evitadas de gases de efeito estufa (GEE) e uma análise detalhada do ci- clo de vida. As diferentes matérias-primas para a produção de etanol também devem ser comparadas em tais termos, bem como a eficiência do uso da terra (Goldemberg; Coelho; Guardabassi, 2008).
Atividades consumidoras de energia
Na produção de etanol o consumo de energia na cadeia produtiva pode ser resumido em duas prin- cipais categorias como sugerem Oliveira, Serra e Oliveira, (2014). Segundo os autores, independente da cadeia produtiva, primeiramente antes da análise do balanço energético é necessário considerar a energia gasta na produção, a qual pode ser resumida conforme detalhado na tabela 1 .
Tabela 1 - Atividades consumidoras de energia na produção de etanol. Produção Agrícola
Processo Produtivo
1. Produção, transporte e aplicação de fertilizante. 2. Mão de obra
3. Transporte de matéria prima máquinas agrícolas
1. Edificações
2. Produção e Transporte de mercadorias 3. Equipamentos
4. Eletricidade
5. Mão de obra
6. Transporte entre as fases de produção 7. Calor para destilação
8. Transporte do produto até o consumidor
Fonte: Oliveira; Serra e Oliveira (2014)
Balanço Energético do etanol da cana de açúcar
O primeiro balanço energético calculado para a produção de cana-de-açúcar em condições brasilei- ras foi publicado por volta de 1978, período ante-
fóssil necessários no balanço energético da produ- ção do etanol de primeira geração, equivale a 8,06 GJ.
Tabela 2 - Balanço energético para a produção de etanol de cana-de-açúcar sob condições brasileiras.
rior à produção de veículos que empregavam etanol
hidratado. Esse estudo serviu como ponto de par- tida para estudos posteriores publicados por volta de 1993, os quais sempre apresentaram resultados muito baixos ou negativos devido ao grande con- sumo de fontes fósseis. Este estudo serviu como base para os trabalhos mais recentes, os quais de- monstram melhoria no balanço energético devido à substituição de mais de 50% da energia fóssil pelo uso do bagaço de cana.
Em trabalho publicado em 2005 (Urquiaga, Al- ves e Boodey, 2005) com base na produtividade média de cana-de-açúcar no estado de São Paulo
Rendimento (colmos de cana) Produção de etanol
Máquinas agrícolas e transporte à usina
Fertilizante/pesticidas Mudas/toletes Insumos na Usina 1
Equipamentos e prédios Total
Energia produzida no etanol Balanço energético (Energia Ge- rada/ Energia fóssil investida).
84,0 t
7.224 l/t 5,6
7,23 0,48 0,62 6,03 19,98 161,10 GJ
8,06
(84 t.ha-1), produção de etanol próximo a 86 litros/t de cana fresca e valor calorífico para o etanol de 22,3 MJ.L-1, ficou demonstrado que a produção to- tal de energia no etanol para esses valores soma 161,1 GJ.ha-1. Tomando esses dados como referên- cia para a produção brasileira de etanol, fica de- monstrado pela tabela 2 que os ingressos de energia
A partir da tabela 2 observa-se que os maiores gastos energéticos se relacionam ao uso de fertili- zantes e pesticidas, seguidos por manutenção, de- senvolvimento predial e por último, máquinas agrí- colas e transporte. Em relação a esses dados, Cam- pos e Campos, (2004) relatam que a produção e aplicação de agrofármacos devem representar uma
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pequena parcela da energia empregada na agricul- tura. Segundo esses autores, nos EUA a produção e aplicação desses produtos representam pouco mais de 5%do total de energia utilizada, o que repres enta 0,2% do total de consumo de energia. Por outro lado, os autores estimaram que na agricultura bra- sileira utiliza-se 21% de sua energia na forma de
combustíveis, 58% na forma de fertilizantes, 14% na forma de agrotóxicos e 6,8% para irrigação, transporte e outros. Para estes dados, os autores não consideraram a energia embutida nas máquinas. Em trabalho mais detalhado, Santos e Santos (2009) fazendo uma análise da viabilidade energé- tica gasta na produção de etanol em microdestila- rias quantificaram a energia gasta pela produtivi- dade da cana em quilocaloria por tonelada de cana (kcal/TC). Os autores apresentaram uma análise mais detalhada, abordando os gastos deste o setor
agrícola até o setor industrial. As atividades identi- ficadas pelos autores como consumidoras de ener- gia e seus respectivos gastos por tonelada de cana no setor agrícola são expressos na tabela 3, na qual é possível observar que os maiores gastos são deri- vados da utilização de insumos agrícolas e pelo se- tor de transporte.
Tabela 3 - Energia consumida no setor agrícola para obtenção do etanol por tonelada de cana-de- açúcar .
Processos agrícolas Energia consumida (kcal)
Atividade 5.869
Transportes 2.087 Fertilizantes (NPK) 25.784
Calcário 2.938 Herbicidas 3.489
partir de 1 tonelada de cana, valores responsáveis por um balanço energético aproximado de 3,15.
Tabela 4 - Energia consumida no setor industrial para a obtenção do etanol por tonelada de cana-de - açúcar.
Atividade Energia consumida (kcal)
Queima de lenha 19.433
Energia elétrica 19.074 Lubrificantes 170
Edificações 35.239 Equipamentos 11.634 pesados
Equipamentos Leves 4.472 Total 90.022
Fonte: Adaptada de Santos e Santos (2009).
Oliveira, (2010) em trabalho mais abrangente e comparativo entre a produção de etanol a partir da cana e do milho encontraram um valor de 8,3 para uma produtividade de 86 litros por tonelada. Para os cálculos o autor levou em consideração as usinas que entraram em operação a partir de 2001, nas quais as unidades de processamento de cana utili-
zam turbogeradores acionados por turbina multies- tágios e equipamentos mais potentes. Em tais usi- nas, segundo Lamonica (2010), do potencial tér- mico do combustível consumido, 3,5% é transfor- mado em eletricidade, outros 3,5% são transforma- dos em trabalho mecânico e 67,2% são transfor ma- dos em energia térmica, que por sua vez é empre- gada na produção de açúcar/álcool (Lamonica , 2010; Oliveira, 2010). A partir dessa premissa, o autor apresentou um balanço de energia proveni-
Mudas
Caminhões e Tratores Implementos
1.787 20.658 3.826
ente da produção de etanol através da cana con- forme pode ser verificado na tabela 5, com projeção até o ano de 2020.
Total 66.438 Fonte: Adaptada de Santos e Santos (2009).
Tabela 5 - Balanço de energia na produção do eta- nol da cana (MJ/tc).
Outra análise realizada pelos autores refere- se aos gastos exigidos no setor industrial, responsável por um consumo ainda maior que o necessário no setor agrícola e apresentando uma diferença supe- rior a 23,584 kcal. Os dados completos estão deta- lhados na tabela 4 .
Os dados registrados individualmente pelos au- tores permitem observar que, o gasto total de ener- gia fóssil inserida na produção de etanol de uma to- nelada de cana-de-açúcar é de 157.547 kcal. Os mesmos consideram a geração de 85 litros de etanol por tonelada de cana. Esse valor seria responsável
pela geração de 383.394 kcal de energia pelo etanol e 79.160 kcal pela queima do bagaço, totalizando uma produtividade de 462.554 kcal de energia a
Componente do balanço energético
Produção e transporte de cana
Produção de etanol Input fóssil (total) Etanol
Excedente de bagaço Excedente de eletricidade
Output renovável (total)
Fonte: Adaptado de Oliveira (2010).
2005/2006 Projeção 2020
210,2 238,0
23,6 24,0 233,8 262,0 1926,0 2060,0
176,0 0,0 82,8 972,0 2185,0 3032,0
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O diferencial do trabalho apresentado por Oli- veira (2010) está no fato do autor considerar no ba- lanço energético as emissões dos gases responsá- veis pelo efeito estufa (GEE). Assim, a partir desses dados e aqueles destacados na Tabela 4, o autor chegou ao balanço energético médio do etanol ob- tido pelo processamento da cana-de-açúcar, com- parando-o com os resultados observados na produ- ção de etanol a partir do milho (Tabela 6 ).
Tabela 6 - Balanço energético médio total para a produção de etanol a partir das culturas de cana e milho.
Componente do Valores balanço energético Cana Milho Produtividade 86 litros/t 440 litros/t
Balando de Energia
1:3,24 1,29:1 (kcal input:output)
33,6 g 84,9g Emissão de GEE *
CO2/MJ CO2 /MJ Balanço energético
8,3 1,4 médio
Nota: *Gases de efeito estufa originados durante a produção do etanol
nas caldeiras é reabsorvido pela fotossíntese du- rante o crescimento da cana na próxima estação. Todas as necessidades de energia para a sua produ- ção (calor e eletricidade) provêm do bagaço, cujo excesso pode ser usado para gerar eletricidade adi- cional, e consecutivamente, para alimentação na matriz produtora. Dessa maneira, consumo direto de combustíveis fósseis é limitado aos caminhões de transporte, máquinas de colheita e ao uso de fer- tilizantes, ao passo que o consumo indireto de com- bustíveis fósseis é baixo, devido ao fato da Matriz energética brasileira ser baseada principalmente na energia hidrelétrica (Goldemberg; Coelho e Guar- dabassi, 2008). Sob esse ponto de vista, Macedo et
al. (2004) demonstram o equilíbrio de energia e GEE da produção de etanol produzido a partir de cana-de-açúcar (Tabela 7 ).
Tabela 7 - Balanço de energia e gases de efeito es- tufa da produção de etanol da cana-de- açúcar. Output/input de Emissão de GEE Energia (kg/m3 )
8,3a 389 a
(Oliveira, 2010). 10,2b 359 b
No balanço energético realizado por Oliveira (2010) foi possível observar que o autor considerou o uso do bagaço de cana como fonte de eletricidade para o sistema produtivo. Machado (1998) relata
que o excesso de bagaço de cana pode gerar eletri- cidade excedente, a qual pode ser vendida para a rede estadual. Caso essa energia excedente seja in- cluída no balanço energético do etanol, o valor do mesmo pode ultrapassar 10. Esse dado, no entanto, não foi comprovado por Oliveira (2010), que em- bora tenha considerado a eletricidade excedente foi constado um valor inferior ao mencionado por Ma- chado (1998). É possível, porém, que o balanço mencionado por esse último autor não leve em con- sideração os efeitos ocasionados pela emissão de GEE, como considerou Oliveira (2010). Excepcionalmente em relação aos efeitos ocasi- onados pela emissão de GEE, O que torna o etanol da cana atraente como um substituto para a gasolina é que ele é essencialmente um combustível renová- vel. O uso de etanol à base de cana-de-açúcar não resulta em uma emissão líquida significativa de GEE (principalmente CO2). Arazão para isso é que o CO2 resultante da queima de etanol e do bagaço
a Valores médios: cenário baseado nos valores médios de energia e con- sumo de material a partir de tecnologias produtoras precursoras. b Va- lores altos: cenário baseado em valores de energia e consumo de ma- terial a partir do aprimoramento e desenvolvimento de novas tecnolo- gias produtoras. Fonte: Macedo; Leal e Silva (2004)
Quando comparado ao etanol obtido a partir de outras fontes produtoras, o etanol de cana-de- açú- car possui um saldo de emissões de GEE inferior, conforme é possível observar na figura 7. Além desse fator, uma avaliação do ciclo de vida desen- volvida pela Ekos Brasil em 2006 mostrou que, ao
substituir uma parcela de gasolina consumida na Suíça pelo etanol de cana-de-açúcar, o balanço energético é de 6.1, já incluída a energia consumida no transporte de etanol (Goldemberg; Coelho e Guardabassi, 2008; Rodrigues e Ortiz, 2016). Por- tanto, mesmo quando o etanol da cana é exportado para outros países, o balanço energético final é al- tamente positivo em comparação com outras cultu- ras. Graças a esse equilíbrio energético positivo, o setor de açúcar/ etanol evita emissões equivalentes a 13% de todos os setores industriais, comerciais e residenciais brasileiros (Goldemberg; Coelho e Guardabassi, 2008).
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ANTERO et al. / Journal of Biotechnology and Biodiversity / v.7 n.3 (2019) 399- 412 Fonte: Goldemberg; Coelho e Guardabassi (2008); Macedo (2007); Shapouri; Duffield e Wang (2002); Woods e Bauen (2003) .

Figura 7 - Balanço energético da produção de etanol de diferentes matérias-primas. Os dados levam em consi- deração os valores output/input e os saldos de emissão de GEE.
Semelhante ao trabalho de Oliveira (2010), Grego (2011) também realizou um trabalho de comparação entre os balanços energéticos do etanol da cana e do milho. Analisando a eficiência energé- tica e produtividade, a autora chegou a um balanço positivo para produção brasileira de etanol, o equi- valente a 9,4, enquanto para a produção a partir do
milho foi observado um balanço negativo de 0,8. Os dados levantados pela autora demonstraram uma diferença aproximada de 1,1 em relação aos dados apontados por Oliveira (2010) para o balanço energético do etanol obtido a partir da cana-de- açú- car. Os dados completos levantados pela autora es- tão dispostos na tabela 8 .
Tabela 8 - Incorporação e balanço energético para o etanol de cana-de-açúcar e de milho .
Componente do balanço energético
Valores Cana-de- açúcar
Milho
Produtividade (kg/ha) 79.500 8.655
Incorporação na produção agrícola (Mg/ha) 12.329,70 33.913,00
Incorporação na produção agroindustrial (MJ/ha) 2.611,10 54.941,60
Incorporação total (MJ/há) 14.940,80 88.854,60
Etanol produzido (L/há) 6.510,00 3.217,47
Energia contida no etanol (MJ) 139.639,50 69.014,73
Balanço energético (input:output) 9,4 0,8
Fonte: Grego (2009)
Resultado semelhante ao observado por Grego (2011) também foi relatado por Soares et al. (2009). Com base nas informações disponibilizadas em 2009 no banco de dados do IBGE, os autores reali- zaram os cálculos para o balanço energético e en- contraram um valor de 9,35. O balanço calculado por eles considerou desde as operações agrícolas, passando pela análise completa do consumo de energia, na forma de óleo diesel combustível, até chegar nas etapas de processamento na usina. Os
autores também supuseram que a colheita da cana ainda feita manualmente após queimada, o que ocorre em aproximadamente 60% da área canavi- eira nacional. No entanto, essa realidade vem sendo modificada pela introdução da colheita mecani- zada, a qual segundo eles deverá aumentar o con- sumo de energia fóssil e, portanto, diminuir o ba- lanço energético. Na tabela 9 tem-se o detalha- mento do consumo de energia fóssil na etapa agrí- cola.
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Tabela 9 - Consumo de energia fóssil na etapa agrícola do etanol produzido a partir de cana-de-. Os valores estão expressos por hectare.
Atividade Quantidades MJ/ha/ano
Trabalhos 64,0 h 501,8
Maquinas 186,5 kg 1.588,8
Óleo Diesel 28,8 L kg 1.383,7
Nitrogênio 56,7 kg 3.061,8
Fósforo 16,0 kg 51,0
Potássio 83,0 kg 488,9
Calcário 367,0 kg 478,9
Sementes 2.000,0 kg 252,2
Herbicidas 3,20 kg 1.445,3
Inseticidas 0,24 kg 87,3
Aplicação da Vinhaça 180 m3 656,0
Transporte de insumo 820,0 kg 276,8
Transporte da cana 24,7 L 2.058,0
Transporte total 2.334,8
Total das operações agrícolas 12.329,7
Entradas Quantidades MJ/ha/ano
Reagentes químicos usados na usina - 487,6
Água 0,0
Cimento 11,5 kg 75,9
Aço leve estrutural 28,1 kg 841,3
Aço leve em equipamentos 23,1 kg 693,5
Aço inoxidável 4,0 kg 287,1
Retificação até 99,5% - 225,3
Tratamento de efluentes - 0,0
Total de entradas na usina - 2.611,1
Total de todas as entradas de energia fóssil - 14.940,8
Fonte: Adaptado de Soares et al., (2009).
A partir dos dados demonstrados na tabela 9 os autores realizaram o cálculo do balanço energético,
correspondendo ao total das operações agrícolas e as entradas de energia fóssil investida (Tabela 10) .
Tabela 10 - Balanço energético do etanol produzido a partir de cana-de-açúcar nas condições brasileiras atuais
Saídas Quantidades MJ/unidade MJ/ha/ano
Rendimento da cana-de-açúcar 79,5 Mg/ha
Produção total de etanol 6.510,0 L/ha 21,45 139.639,5
Balanço energético final 9,35
Fonte: Adaptado de Soares et al., (2009).
Entre os autores consultados, Soares et al., (2009) foram os únicos a apresentar um balanço energético de maneira a contemplar o estudo do ci- clo de vida da produção do etanol, no qual incluiu - se a energia fóssil empregada na fabricação, manu- tenção e possível desmontagem e disposição de equipamentos e construções utilizadas na manufa- tura de um produto. Todas essas etapas estão con- tabilizadas na Tab. 8, no item “máquinas”, onde se incluem tratores e implementos agrícolas. Além dessa questão, os autores também foram os únicos a detalhar o processo empregado na colheita da cana, o que não foi mencionado pelos demais. No
entanto, não se evidenciou a energia elétrica exce- dente como mencionou Oliveira (2010), o que po- deria contribuir para um balanço energético maior. Além disso, o balanço realizado pelos autores foi realizado em um período no qual a colheita da cana era realizada após queimada do terreno, realizada superada atualmente.
Garcia et al. (2011) em trabalho realizado no México sobre a produtividade do etanol a partir da cana naquele país e utilizando o método do ciclo de vida, obteve uma quantidade de energia de 4,8 GJ para cada GJ gasto durante as etapas produtivas, o que corresponde a um balanço energético de 4,8. O valor fornecido por esse autor mostrou-se inferior
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aos valores relatados por pesquisadores brasileiros. É necessário considerar nesse aspecto que as con- dições brasileiras de produção são mais fa voráveis que as verificadas no México, uma vez que o Brasil é apontado como uma das maiores potências na produção de etanol a partir da cana, com uma tec- nologia inovadora no ciclo produtor.
Comparativo entre os balanços energéticos veri- ficados
Na figura 8 tem-se o balanço energético verifi- cado a partir das diferentes fontes de pesquisas con- sultadas, considerando cada atividade abordada pelo autor durante o cálculo. Com uma média de 6,74, as divergências de valores são atribuídas às diferentes atividades consideradas por cada autor no desenvolvimento de seu balanço.

Figura 8 - Comparação entre os balanços energéti- cos verificados para o etanol de cana-de- açúcar. Dados: R1 (Urquiaga; Alves; Boodey, 2005); R2 (Santos; Santos, 2009); R3 (Oliveira, 2010); R4 (Grego, 2011); R5 (Soares et al., 2009) R6 (Garcia et al., 2011).
A partir da figura 8 é possível observar que o os dados levantados pelos autores Santos e Santos (2009) e Garcia et al., (2011) se mostraram abaixo da média global, tendo o primeiro apresentado uma diferença de quase 46% em relação á média verifi- cada pelos demais autores. É preciso levar em con- sideração, no entanto, que o trabalho publicado por Santos e Santos (2009) foi realizado em cima da produtividade de uma micro destilaria, na qual se tem uma produtividade menor e um gasto energé- tico diferenciado em relação às usinas maiores, que apresentam tecnologias mais sofisticadas para a produção. Por outro lado, como debatido anterior- mente, os resultados demonstrados por Garcia et
al., 2011 tem relação com o fato do México ser um
país com pouco desenvolvimento em tecnologia su- croalcooleira, apresentando uma tecnologia produ- tiva menos eficiente.
Embora os principais dados mencionados sejam majoritariamente nacionais, exceto o trabalho de Garcia et al., (2011) e apresentem um balanço ener- gético médio acima de 7, alguns trabalhos publica- dos no exterior sobre o balanço energético do etanol produzido no Brasil trazem balanços energéticos baixos, entre 3,7 e 1,1, como sugeriram Pimentel e Patzek (2008) e Oliveira (2008). No entanto, os da- dos demonstrados por esses autores foram susten- tados em informações defasados de uso de energia fóssil nas operações agrícolas, além de empregarem estimativas muito altas do custo energético do transporte da cana do campo até a usina, fatores que foram gradativamente melhorados até a produtivi- dade atual.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Brasil é apontado atualmente como o segundo maior produtor mundial de etanol e os valores das sagras atuais colaboram para a manutenção dessa posição. Dados sobre sua viabilidade e sustentabi- lidade energética são constantemente atualizados por diversos centros de pesquisa ao redor do mundo. Nesse aspecto, o estudo do balanço energé- tico da produção brasileira é de suma importânc ia, uma vez que visa estabelecer os fluxos de energia, identificando potenciais demandas e eficiências re- fletidas pelo ganho líquido e pela relação saída/en- trada, o que determina a viabilidade ou não dos pro- cessos de obtenção de energia. Como observado durante o levantamento bibliográfico, não há con- senso entre os principais autores quanto ao real ba-
lanço energético da produção de etanol. Assim, as principais divergências verificadas entre os podem ser explicadas pelo fato de nem todos terem consi- derado todas as atividades envolvidas na produção do etanol, sendo os gases de efeito estufa (GEE) e o ciclo de vida as atividades menos explorados, em-
bora sejam as atividades que desempenham um dos papéis mais importantes para o cálculo do balanço energético e constatação da viabilidade e sustenta- bilidade energética da utilização do etanol como bi- ocombustível renovável.
Os principais estudos realizados e levantados a partir da revisão realizada demonstraram que o eta- nol de cana-de-açúcar tem um balanço energético aproximadamente entre 8:1-9:1, ou seja, para cada unidade de energia fóssil gerada durante o processo produtivo são obtidas entre oito e nove unidades de energia renovável na forma de etanol. Esses dados refletem tanto as condições de São Paulo, que é apontado como um dos maiores produtores nacio-
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nais, devido às maiores áreas disponíveis para plan- tação, como nas demais áreas nacionais. Embora esse balanço seja positivo, fluxos de energia e de-
terminação da eficiência energética visando á sus-
tentabilidade da agricultura deve ser considerados continuamente, levando em conta que o balanço energético poderá decrescer nos próximos anos à
medida que problemas ambientais relativos à pro- dução agrícola forem surgindo. Esses problemas estão relacionados principalmente à compactação dos solos por tratores e implementos agrícolas, a
contaminação de corpos d’água, lençóis freáticos e solos devido ao uso intenso de agrotóxicos e ferti-
lizantes, aplicação descontrolada de vinhaça, torta de filtro, poluição do ar por queimadas de palha e
escorias de siderurgia.
Diante do atual panorama da produção sucroal- cooleria, reduzir a entrada de energia fóssil, especi- almente aquela relacionada à aplicação de fertili-
zantes- apontado como um dos maiores gastos
energéticos na matriz industrial- seria uma das pri- meiras alternativas para melhoria do balanço ener-
gético. Nesse contexto é preciso diminuir a quanti- dade a poluição de ar proveniente da queima do bagaço e palhada excedente para geração de ener-
gia elétrica e cinzas dessa queima, desenvolver sis-
temas eficientes para o descarte e aproveitamento adequado da água de lavagem da cana e de equipa-
mentos, das águas residuais de condensadores e das
águas residuais domésticas. Alternativas de mitiga- ção, como biodegradação da vinhaça, reaproveita- mento de subprodutos orgânicos, diminuição da produção de gases para geração de energia de ma-
neira mais eficiente, diminuição do consumo e reuso da água, também podem ser destacados como
alternativas para melhoria do balanço energético. Somente a atuação conjunta dessas ações poderão
contribuir para que o etanol continue figurando en- tre as potenciais fontes alternativas de combustível,
contribuindo para a sustentabilidade dos agroecos- sistemas como um todo.
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